Resumo de filosofia: Filosofia Medieval - Santo Agostinho



Filosofia Medieval - Santo Agostinho

Figura 1 - Santo Agostinho - Peter Paul Rubens - c. 1636 e 1638 - Peter Paul Rubens [Public domain], <a href="https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Peter_Paul_Rubens_-_Svat%C3%BD_Augustin.JPG">via Wikimedia Commons</a>

Agostinho de Hipona (354-430) foi um dos principais nomes da Patrística, a filosofia cristã que foi desenvolvida nos primeiros séculos do Cristianismo. Santo Agostinho viveu no período de decadência do Império Romano do Ocidente e seus escritos tiveram muita influência da Filosofia Helenística. Há duas características principais sobre o autor que abordaremos no texto: o uso da razão e da fé em conjunto, e a influência de Platão na sua teoria.

É importante entender a biografia de Agostinho antes de adentarmos na sua filosofia pois a complementa. Nascido em Tagaste, Numídia, província romana que é a atual Argélia. Sua mãe, Mônica, era uma cristã fervorosa e passou sua vida toda tentando converter o filho. Tanto ela quanto o marido queriam que o filho tivesse uma boa educação para assumir uma posição de destaque no magistrado romano. Isso não ocorreu de imediato, pois Agostinho não era bom aluno, o que mudou ao longo do tempo. O que é destacado com frequência em textos sobre ele é a sua caracterização como inquieto e questionador.

Se tornou professor aos 20 anos de idade, e tomou gosto pela profissão. A busca por respostas às perguntas sobre a vida e o homem o levaram a ler e criticar diversas teorias da época, como o ceticismo, por exemplo. Isto é, desse momento em diante, passou a ter contato com os filósofos helenísticos para, assim, criar seu próprio pensamento. Foi a leitura de Neoplatonistas, contudo, que deu base filosófica para as suas interpretações do mundo.  Se mudou para Roma e depois Milão, e lá aprofundou seu pensamento.

Sua jornada cristã começou quando acabou sob influência de Santo Ambrósio (340-397) e a Bíblia, especificamente as Epístolas de Paulo. Se converteu, voltou ao Norte da África, escalou a precária hierarquia da Igreja e se tornou Bispo da sua cidade natal. Sua obra foi escrita a partir desse momento em que entrou para a vida eclesiástica. Como vimos em Cristianismo e suas origens, até a sua consolidação, a Igreja como instituição demorou para ser criada. O Cristianismo teve início como uma doutrina boca-a-boca, feita na prática, e foi ganhando peso. O respeito político veio com a aceitação da elite, e, depois, com a oficialização como religião do estado romano. Os primeiros séculos foram permeados de incertezas e perseguições, o que motivaram questionamentos acerca da doutrina. Isto é, era uma religião combativa e contestada ao mesmo tempo. É nesse contexto que surgem as ideias de Agostinho. Em seus escritos, destacam-se: Solilóquios, de 327; Do Livre Arbítrio, de 388 a 395; De Magistro, 329; Confissões, de 400; A Cidade de Deus, de 413 a 426 e Retratações, de 426.

A Patrística foi a filosofia cristã dos chamados “pais – ou padres – da Igreja” que precisava estipular as bases de pensamento da doutrina. Ela veio para inserir o Cristianismo no contexto filosófico e construir seus andaimes epistemológicos. Explicar a fé, criar a teologia cristã a partir de argumentos racionais. Isso significa que Agostinho fez parte dessa iniciativa de usar a razão para justificar a sua fé.

A reinterpretação de Platão foi o diferencial do pensamento cunhado pelo bispo, pois a ideia de corpo e alma, do material e do inteligível, como distintos se tornou a base da sua teoria. O corpo era suscetível às paixões, desejos e pecados que se conectam ao mundo sensível. A materialidade não leva ao conhecimento profundo, verdadeiro, pois é limitada, diferentemente da alma. Esta é a origem de tudo, é nela que residem a verdade o saber eternizado. Para alcançar esse conhecimento deve-se utilizar da razão e esse pensamento se interiorizaria ao homem, aquilo que já existia passa a ser acessível. E é na alma, no mundo inteligível, que reside Deus, pois Ele é a verdade.

O homem sem a palavra divina, portanto, é um pecador, ao mesmo tempo em que foi o único a ser criado à semelhança de Deus e possuir, na alma, os ensinamentos Dele, que podem ser alcançados a partir da própria vontade de buscar a Iluminação. Como dito anteriormente, o paradoxo da humanidade é ter a Deus na alma e ser tentado na realidade. Assim, a única forma de não cair no ímpeto pecador é aceitar a Deus ilimitadamente para obter a verdade real. É o uso correto da sua liberdade, entregá-la a Ele. Se o seu livre-arbítrio foi utilizado da outra forma, ele volta ao ciclo de ser levado pelas paixões e desejos, se tornando ignorante e preso na própria escolha. Já nas mãos de Deus, encontraria a verdade e o conhecimento, isto é, a luz.

Para ter capacidade de alcançar o saber, o sujeito necessita de ajuda, pois os vícios mundanos estão embrenhados em todos. Precisaríamos remover as camadas que nos cegam e relembrar os ensinamentos de Deus. O que vemos, portanto, é uma reinterpretação da teoria platônica pelo olhar de Agostinho, o que significa que o grego não seria infalível aos seus olhos. Ele cria a Teoria da Iluminação, a conscientização da verdade divina a ser alcançada pelo uso da razão. A teologia, a ciência que estuda Deus, que discute e entende essa verdade. É por meio dela que se atinge a felicidade.

Dessa forma, ele concilia dois lados e dá ao Cristianismo um alicerce intelectual. Até então, a doutrina era baseada na evangelização, na prática, e não na estrutura dogmática. A Patrística inaugurou um novo momento da Igreja cristã, que se tornou a principal instituição da Idade Média, uma das mais sólidas.

Depois de uma vida de inquietudes, o pensamento de Agostinho é visto como uma extensão da sua própria busca por conhecimento. Outro ponto da sua filosofia é a criação da polêmica Teoria da Predestinação Divina, na qual argumenta que Deus agraciaria aqueles que seriam salvos, que alcançariam conhecimento. O livre-arbítrio da humanidade deveria ser utilizado para esse fim, pois não adiantaria a predestinação se o homem não demonstrar a sua vontade. Essa ideia de eleição divina foi criticada, mas inspirou vários pensadores ao longo da História.

Agostinho, ao criar sua filosofia, conecta a fé e a razão, que deu à Igreja não só uma base teológica, acrescida de outros pensamentos, como também um alicerce intelectual. Outros vieram para desenvolver ainda mais a filosofia cristã, como São Tomás de Aquino.

 

A Patrística e a Escolástica, que veremos em outro texto, são as duas principais teorias filosóficas cristãs. Os vestibulares focam bastante nas duas juntas, em comparação. Algumas provas em específico, como a UFU, por exemplo, cobram filosofia de forma mais aprofundada. Quem for fazer curso de humanas, para as segundas fases também é importante ter uma noção maior sobre a filosofia medieval. O Enem tem costume de apresentar um texto para interpretação, mas saber as características principais de cada ponto ajuda na resolução da questão.

1. (Enem 2018) Não é verdade que estão ainda cheios de velhice espiritual aqueles que nos dizem: “Que fazia Deus antes de criar o céu e a terra? Se estava ocioso e nada realizava”, dizem eles, “por que não ficou sempre assim no decurso dos séculos, abstendo-se, como antes, de toda ação? Se existiu em Deus um novo movimento, uma vontade nova para dar o ser a criaturas que nunca antes criara, como pode haver verdadeira eternidade, se n’Ele aparece uma vontade que antes não existia?”

AGOSTINHO. Confissões. São Paulo: Abril Cultural, 1984.

A questão da eternidade, tal como abordada pelo autor, é um exemplo da reflexão filosófica sobre a(s) 

a) essência da ética cristã.    

b) natureza universal da tradição.    

c) certezas inabaláveis da experiência.    

d) abrangência da compreensão humana.    

e) interpretações da realidade circundante.    

2. (Ufu 2018) Agostinho, em Confissões, diz: "Mas após a leitura daqueles livros dos platônicos e de ser levado por eles a buscar a verdade incorpórea, percebi que 'as perfeições invisíveis são visíveis em suas obras' (Carta de Paulo aos Romanos, 1, 20)".

Agostinho de Hipona. Confissões, livro VII, cap. 20, citado por: MARCONDES, Danilo. Textos Básicos de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2000. Tradução do autor.

Nesse trecho, podemos perceber como Agostinho

a) se utilizou da Bíblia para conhecer melhor a filosofia platônica.   

b) utiliza a filosofia platônica para refutar os textos bíblicos.   

c) separa nitidamente os domínios da filosofia e da religião.   

d) foi despertado para o conhecimento de Deus a partir da filosofia platônica.   

Gabarito: 

Questão 1 - [D] – O trecho que está no enunciado demonstra o que seria a compreensão do homem acerca da eternidade de Deus. Assim, Agostinho discute como o homem é limitado para entender as questões divinas.

Questão 2 - [D] – Nessa questão temos exposto o uso da filosofia grega, no caso a de Platão, como base epistemológica para o pensamento agostiniano. Ele repensa os valores cristãos a partir dos escritos gregos e desenvolve a teologia cristã.

Agostinho de Hipona (354-430) - inquieto e questionador.

Filosofia Helenística - ceticismo

Platão - Neoplatonistas

- Santo Ambrósio (340-397) e a Bíblia - Epístolas de Paulo

Obras: Solilóquios, de 327; Do Livre Arbítrio, de 388 a 395; De Magistro, 329; Confissões, de 400; A Cidade de Deus, de 413 a 426 e Retratações, de 426.

- Patrística - “pais da Igreja” – razão +

Reinterpretação de Platão – mundo sensível e mundo inteligível - corpo e alma

- Teoria da Iluminação - conscientização da verdade divina a ser alcançada pelo uso da razão

- Teoria da Predestinação Divina - livre-arbítrio da humanidade