A Constituição de 1824
Figura 1 - Primeira página da Constituição de 1824 - Arquivo Nacional/RJ - Brazilian National Archives [Public domain], <a href="https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Constitui%C3%A7%C3%A3o_1824_f_01.tif">via Wikimedia Commons</a>
Como vimos em Primeiro Reinado, a Constituição de 1824, ou a Constituição Outorgada, foi a primeira carta de leis que regulamentou o país. Sua criação ocorreu em meio a debates e escândalos, inclusive com o fechamento da Assembleia Constituinte em 1823. Abordaremos o conteúdo, o processo de discussão e os problemas que ocorreram.
A Constituição Política do Império do Brasil outorgada por D. Pedro I em 25 de março de 1824, começava assim: “Em nome da Santíssima Trindade. Título 1º - Do Império do Brazil, seu Territorio, Governo, Dynastia e Religião”. Nesta primeira parte definiram o Brasil como uma nação independente, formada por províncias instituídas pelo Estado, com o governo monárquico hereditário e constitucional, atestando que a Dinastia seguirá a linhagem de D. Pedro I e que o Estado, adotou, oficialmente, o Catolicismo. Isso significa que as primeiras linhas que regulamentam a administração nacional salientavam o caráter centralista do governo. Esse ponto de vista foi um dos grandes temas debatidos pelos membros da Assembleia.
Em 03 de maio de 1823, foi aberta a Assembleia Constituinte brasileira, convocada pelo monarca em 3 de junho de 1822. O debate entre liberais e conservadores era direcionado à gradação de poder de todos os níveis do governo e quais as regras para os eleitores. Conservadores, apoiados por José Bonifácio, pelos latifundiários e grandes comerciantes, queriam eleições indiretas e o que selecionaria os votantes seria a renda. Os liberais queriam eleições diretas, e que apenas os alfabetizados e proprietários poderiam votar. Mesmo que os critérios fossem diferentes, ambos acreditavam em seleções restritivas aos direitos políticos. Por exemplo, mulheres e escravos não poderiam exercer o direito de escolha de representantes.
A primeira versão do texto ficou pronta em setembro de 1823, e foi assinada por Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, irmão de José Bonifácio, que via a Constituição francesa como base intelectual. Vários pontos foram inseridos no documento: a soberania nacional, a exclusividade do mandato de D. Pedro ao Brasil – já que poderia assumir o trono de português – e a definição dos três poderes para a organização política brasileira. Esses eram o Executivo, representado pelo monarca; o Legislativo, formado pelos deputados e senadores; e o Judiciário. Deputados e senadores teriam mais poder decisivo do que o Imperador, e essa era uma estratégia do Partido Brasileiro para evitar que o Brasil se tornasse uma monarquia absolutista.
O primeiro texto não agradou tanto o Partido Português, que apoiava uma maior centralização de poder nas mãos de D. Pedro, quanto parte da sociedade que teria sua participação política limitada. A versão apresentada definia os trâmites eleitorais a partir do critério censitário. Para se candidatar, o cidadão deveria possuir de 500 a 1000 alqueires de mandioca. Para votar, deveria ter uma renda anual de 150 alqueires, o que atingia os direitos políticos da maioria dos brasileiros.
A Constituição da Mandioca não foi bem aceita pela alta cúpula do governo, que rejeitava as restrições ao poder do Imperador. Os debates ficaram mais acalorados entre os portugueses que exigiam maior poder para si e para o monarca e, também entre os pequenos e médios comerciantes e produtores que queriam participar da vida política, mas o critério da renda era um empecilho. A situação piorou consideravelmente quando José Bonifácio apresentou um projeto para a abolição gradativa da escravidão no Brasil, tendo como primeira medida o fim do tráfico. Esse tema era muito sensível aos parlamentares, já que a mão de obra escrava era vista como essencial e o tráfico extremamente lucrativo.
O clima acirrado atingiu a população e muitos protestos invadiram os centros urbanos, sobretudo no Rio de Janeiro. Acusações de caráter xenofóbico eram escritas nos jornais, causado linchamentos e piorando a situação nas ruas. Por esses motivos, e por não querer uma Monarquia Constitucional em que o seu cargo se tornasse irrelevante, D. Pedro dissolveu a Assembleia Constituinte no dia 12 de novembro de 1823, após a chamada Noite da Agonia. Nesta, os representantes formalizaram suas queixas ao permanecerem em seus postos mesmo com ordens do Imperador para que parassem as discussões. Acreditavam que a opinião pública a favor ajudaria no caso, o que não aconteceu. O Exército enviou homens que, a pedido do monarca, retiraram os membros da Assembleia, prendendo alguns e forçando o exílio aos considerados símbolo do problema, como José Bonifácio e seus irmãos.
A partir desse momento, o próprio Imperador reuniu um grupo de pessoas conhecidas, brasileiros com formação em Portugal, para redigirem a nova versão da Constituição. Esta era baseada no documento dos irmãos Andrada e manteve pontos importantes, como o critério censitário para a participação eleitoral e política, mas a renda seria medida em reis e não em alqueires de mandioca.
A divergência maior – o poder do Imperador – foi resolvida e apresentada no artigo 10, Título 3º - Dos Poderes e Representação Nacional, que dizia: “Os Poderes Políticos reconhecidos pela Constituição do Imperio são quatro: Poder Legislativo, o Poder Moderador, o Poder Executivo, e o Poder Judicial”. Os pensamentos do político francês Benjamin Constant (1767-1830) foi a base intelectual para a criação do Poder Moderador, que dava ao Imperador o poder máximo de veto, coordenação e atribuição de cargos e decisões. No artigo. 98, temos a descrição: “O Poder Moderador é a chave de toda a organisação Politica, e é delegado privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro Representante, para que incessantemente vele sobre a manutenção da Independencia, equilibrio, e harmonia dos mais Poderes Politicos.” Ou seja, D. Pedro se tornava o Estado e era visto como o mantenedor do balanço político no Brasil.
A Constituição Outorgada passou a valer a partir do dia 25 de março de 1824. O Brasil se tornava uma Monarquia Constitucional na qual o monarca tinha plenos poderes. Essa situação não foi bem aceita pela população, o que causou diversos conflitos no Primeiro Reinado.
Fonte: Constituição de 1824: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm
A primeira constituição brasileira deu o tom da organização política que o Imperador queria. Todas as constituições que tivemos refletem a situação do país, portanto, é importante analisá-las para entender nossa história. No caso da de 1824, o Poder Moderador é a característica principal, que a diferencia das posteriores. Além disso, inseriu o voto censitário, marcando a participação política por décadas.
1. (Uefs 2018) Por onde mais se distanciava a ficção parlamentar brasileira do modelo britânico era pelo fato da subida ou da queda de um ministério depender só idealmente, entre nós, de uma eventual maioria na câmara popular.
(Sérgio Buarque de Holanda. “Do Império à República”. In: O Brasil monárquico, tomo II, vol 5, 1985.)
O historiador refere-se ao regime monárquico brasileiro como “ficção parlamentar”, porque
a) o ordenamento político brasileiro era sustentado pelas tradições orais.
b) os ministros podiam governar sem contar com o apoio do Parlamento.
c) o debate de ideias políticas no país estava interditado pelo governo imperial.
d) a manutenção de grupos dirigentes submetia-se ao exercício do poder moderador.
e) o poder absolutista do rei proibia a constituição de partidos políticos.
2. (Udesc 2017) Em 25 de março de 1824, Dom Pedro I outorgou a Constituição Política do Império do Brasil. Em relação à Constituição de 1824, assinale a alternativa correta.
a) O Texto Constitucional foi construído coletivamente pela Câmara de Deputados, votado e aprovado em 25 de março de 1824. Expressava os interesses tanto do partido liberal quanto do partido conservador, para o futuro na nação que recém conquistara sua independência.
b) A Constituição de 1824 instaurava a laicidade no território nacional, extinguindo a religião católica como religião oficial do império e expressando textualmente que “todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico, ou particular em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior do Templo”.
c) A organização política instaurada pela Constituição de 1824 dividia-se em 4 poderes: Executivo, Legislativo, Judiciário e Moderador, sendo que este último determinava a pessoa do imperador como inviolável e sagrada.
d) A Constituição de 1824 determinou a cidadania amplificada e o direito ao voto para todos os nascidos em solo brasileiro, independentemente de gênero, raça ou renda.
e) A Constituição de 1824 promoveu, em diversos artigos, ideais de cunho abolicionista. Tais ideais foram respaldo para movimentos políticos posteriores, tais como a Revolta dos Farrapos e a Revolta dos Malês.
Gabarito:
Questão 1 - [D] – Neste caso, o Poder Moderador é o ponto principal. Com ele, o Imperador tinha amplos poderes em todos os setores, caracterizando uma centralização irrestrita.
Questão 2 - [C]
Constituição de 1824
- Centralização política do Império
- Hereditariedade do poder – Dinastia dos Bragança
- Voto censitário
- 4 poderes – Poder Moderador, Legislativo, Judiciário e Executivo.