Resumo de sociologia: O universo da cultura I



A visão iluminista da cultura

A visão iluminista da cultura está intrinsecamente relacionada ao modelo de sociedade europeia do século XVIII, tanto que os iluministas do período afirmavam, veementemente, que o ser humano racional e consciente era o símbolo do progresso e desenvolvimento europeu. Para os iluministas a cultural é uma consequência natural da educação e instrução, ou seja, ocorre após o indivíduo passar por ambos os processos, a partir dos quais pode usar sua racionalidade em benefício do desenvolvimento pessoal e intelectual. O modelo de sociedade europeia urbano, industrial, republicano e democrático, sinônimo e destaque da civilização europeia, era, segundo os iluministas, não só o mais avançado estágio da vida humana, como também o mais progressivo desenvolvimento cultural. A perspectiva iluminista da cultura enquanto processo de evolução cultural, alinhava-se a teoria segundo a qual todas as culturas estariam em um processo gradual sentido a um mesmo objetivo, sendo a cultura europeia o estágio mais avançado desse processo. Isso contribuiu para difundir a noção de superioridade cultural dos europeus em relação ao resto do mundo, principalmente, durante o imperialismo europeu na África e Ásia durante o século XIX, a partir da falsa propaganda de contribuir para o desenvolvimento cultural desses povos. Na tentativa de demonstrar a superioridade dos europeus em relação ao resto do mundo, vários autores utilizaram-se, especialmente, do progresso tecnológico, proveniente da Revolução Industrial, e racionalização do homem europeu como critério de supremacia cultural europeia.

 

 Evolucionismo e difusionismo da cultura

O evolucionismo cultural é um conjunto de teorias antropológicas fundamentadas nos trabalhos evolucionistas do século XIX, sobretudo, na interpretação distorcida da Teoria da Evolução das Espécies de Charles Darwin. De acordo com a corrente e seguindo a interpretação proposta da teoria de Darwin, a sociedade seria similar a um organismo vivo submetida às mesmas leis da evolução, da adaptação e da seleção natural apresentadas por Darwin em sua obra A Origem das Espécies publicada em 1859. Edward Tylor foi um dos principais antropólogos dessa corrente ao defender que as diferentes culturas existentes se diferenciariam apenas pelo grau de civilização, corroborando, assim, para difundir a “superioridade cultural europeia” como sociedade mais avançada culturalmente. Uma das principais consequências negativas dessa perspectiva é que a diversidade cultural não é valorizada, pois é reconhecida uma cultura, nesse caso europeia, como mais avançada e as demais tendem a seguir seus padrões de civilização. Essa chave interpretativa da realidade cultural serviu de base para a invasão e dominação dos continentes africano e asiático durante o imperialismo europeu no século XIX. Paralelamente ao evolucionismo cultural na Europa, surgiu o difusionismo cultural, este pretendo explicar as distinções entre as diferentes culturas existentes com base na difusão. O difusionismo foi uma corrente mais ponderada em suas considerações, tanto que é usada na atualidade por diversos arqueólogos. Segundo os difusionistas, as práticas culturais das distintas culturas seriam transmitidas mutuamente através do comércio, da guerra e da imitação. Isso seria suficiente para explicar as práticas culturais comuns entre culturas distintas.

 

Antropologia Estruturalista

As teorias evolucionistas que buscavam viabilizar e legitimar a dominação europeia sobre as demais sociedades do mundo, notoriamente durante o século XIX, foram perdendo legitimidade e força no século XX, devido ao surgimento de novos trabalhos e vertentes pautadas no embasamento científico. Surgiram novos estudiosos e com eles trabalhos e pesquisas salientando aspectos peculiares, como fez a antropologia culturalista americana, e gerais, como faria a antropologia estruturalista francesa, das diversas culturas. No entanto, o mais importante é que o faziam não mais exaltando os hábitos europeus como expressão máxima de cultura e civilização, mas explorando tanto aspectos e comportamentos individuais quanto gerais de todas as culturas sociais. A antropologia estruturalista teve como principais expoentes o sociólogo e antropólogo francês Marcel Mauss e o filósofo e antropólogo, também francês, Claude Lévi Strauss ambos engajados e comprometidos a encontrar estruturas formais, simbólicas, linguísticas e míticas comuns às mais distintas sociedades existentes. Em seus estudos antropológicos, Lévi Strauss concluiu que todos os povos do mundo possuem muitas características em comum, como o incesto, quando estudados e analisados de maneira analítica e aprofundada. Segundo o autor, todas as sociedades humanas conhecidas possuem e prescrevem alguma restrição as relações sexuais entre familiares diretos, como pais e filhos ou irmão e irmã e vice-versa. Claude Lévi Strauss foi muito importante no Brasil para o desenvolvimento de pesquisas antropológicas, principalmente após sua passagem pelo país na década de 1930.

 

O Culturalismo e aculturação

Em sua matriz, o culturalismo surgiu não só como resposta às teorias do evolucionismo, mas também como uma tentativa de propor novos caminhos e alternativas para compreensão da diversidade cultural existente. As pesquisas realizadas enfatizavam principalmente a individualização dos aspectos culturais e sociais das sociedades existentes. Autor e estudioso de uma visão particularista, segundo a qual cada cultura possui uma evolução particular, sem qualquer indicativo ou padrão cultural a ser seguido, o antropólogo alemão Franz Boas foi um dos mais proeminentes estudiosos dessa corrente. De acordo com ele, não há, pelo menos em termos sensatos, como utilizar padrões comparativos para medir o nível cultural no qual uma determinada cultura se encontra, na medida que o processo evolutivo de cada cultura está diretamente associado às condições geográficas, climáticas, psicológicas e históricas enfrentadas por cada grupo no processo de formação cultural. Assim, não haveria possibilidades comparativas entre as culturas europeias e africanas, pois cada uma delas possui suas próprias particularidades e impor comportamentos nesse caso seria uma clara violação de formação cultural. Segundo Boas, a cultura não deve ser pensada como padrão unificador para o qual toda a diversidade cultural deve convergir, mas antes como um processo com múltiplas possibilidades de desenvolvimento. A essa perspectiva está alinhado o processo sociológico e antropológico de aculturação que se dá no encontro entre duas ou mais culturas, a partir do qual os diferentes grupos trocam experiências culturais, resultando na modificação de suas culturas. Isso ocorre tanto pela assimilação de aspectos externos, quanto pela perda de elementos internos.

 

O caráter simbólico da cultura

A cultura é uma das principais manifestações sociais do gênero humano, através da qual nos expressamos, nos diferenciamos e somos habilitados a construir redes de relações sociais. Por meio de sistemas simbólicos, como tradições, crenças, linguagens e ritmos, povos são unificados e sociedade construídas, considerando-se sempre os laços culturais existentes no âmbito social. Por essa razão, o filósofo alemão Ernst Cassirer definiu o ser humano não como Homo sapiens, mas como Homo simbolicus, isto é, como indivíduo capaz de criar e atribuir significados a símbolos, conferindo, assim, tanto sentido à vida e à realidade quanto a possibilidade de desenvolvimento de vida coletiva e comunitária. Segundo Cassirer, a diversidade de povos, nas mais variadas localizações de espaço e tempo, é a variante que viabiliza a multiplicidade de culturas existentes, cada uma com suas próprias manifestações simbólicas, valores e hábitos. Outro importante estudioso do universo cultural foi o antropólogo norte-americano Clifford Geertz, ao considerar que a nossa existência enquanto seres sociais é completamente associada à capacidade de simbolizar, sem a qual as relações sociais e, consequentemente, a vida coletiva seriam impossíveis. De acordo com Geertz, o ser humano é um animal preso às teias simbólicas que ele mesmo construiu, ou seja, à cultura, aos costumes e hábitos por ele produzidos. Assim, percebemos o importante papel da cultura, tanto para viabilizar a vida coletiva quanto para fornecer sentido à realidade, conferido por ambos os autores.

 

O conceito tradicional de cultura, cultura tradicional, erudita e de massa

É impossível apresentarmos uma definição única e universal da palavra cultural, pois de acordo com o antropólogo norte-americano Alfred Kroeber, há pelo menos 600 significados diferentes dessa mesma palavra no mundo. Segundo Kroeber, a cultura possui em si um poder de coerção social tão profundo que o indivíduo tende a agir mais de acordo com padrões culturais de uma determinada sociedade do que através do seu próprio instinto. Por outro lado, o polonês Bronislaw Malinowski, diferentemente de Kroeber que acreditava ser possível entender uma cultura externamente, julgava que só é possível compreendê-la quando se é parte dela, isto é, quando se é membro de seu corpo social. Por outro lado, o antropólogo brasileira Roberto da Matta definiu a cultura como um mecanismo pelo qual as pessoas classificam e outorgam o mundo e a si mesmos. Como vemos não podemos defini-la universalmente, mas podemos falar em acepções mais específicas, como cultura tradicional, erudita e de massa. A cultura tradicional ou popular, pode ser compreendida como um conjunto de práticas, manifestações, valores, crenças e saberes típicos de um grupo social, à medida que contribui para a formação de sua identidade. O folclore, as crenças, o artesanato, as tradições e os costumes são algumas de suas características. Diferentemente da popular, a erudita está relacionada a práticas e valores “mais elaborados” ligados aos grupos que estão nas esferas de poder social, se opondo, assim, à noção de cultura popular. Por outro lado, a cultura de massa tende a se apropriar de aspectos e valores populares a fim de transformá-los em produto de consumo, como músicas, novelas e filmes.