Durkheim: a coesão e a coerção social
Figura 1 - Fotografia de Émile Durkheim - s/autor - c. década 1910.
Émile Durkheim (1848-1917) foi um pensador francês, discípulo de Auguste Comte (1798-1857) e fundador da Sociologia Moderna. Se utilizando das bases epistemológicas do Positivismo, acreditava que a Sociologia deveria se desenvolver como as ciências da natureza. Dessa forma, criou sua metodologia a partir de conceitos como os Fatos Sociais, coerção social, entre outros.
] Foi como aluno da École Normale Supérieure que entrou em contato com os trabalhos de Comte e, também, Herbet Spencer (1820-1903). Junto de Karl Marx (1818-1883) e Max Weber (1864-1903) formou a tríade da Sociologia clássica, pois formularam diferentes visões de sociedade, mas que inspiraram o desenvolvimento da disciplina. Em seu período de vida, Durkheim testemunhou as profundas mudanças sociais que ocorreram a partir da segunda metade do século XIX, e essas conjunturas foram fundamentais para a sua teoria.
Durkheim era um positivista, mas que não aplicava todas as ideias dessa doutrina em seu método. Empregava apenas a questão da neutralidade e objetividade do conhecimento das ciências humanas como um ponto de partida para entende-las. Suas categorias explicativas sobre a sociedade carregavam valores daquele momento, sobretudo da vida capitalista trazida pela industrialização e também das mudanças políticas oriundas da Revolução Francesa.
O seu objeto de estudo é o Fato Social, um conceito que é explicado por algumas características: - Ele é Geral, ou seja, agrupa e abarca todos dentro de uma mesma categoria;- Ele é Exteriorizado, porque não diz respeito a valores individuais, é maior que o sujeito, se relaciona ao que se aprende desde o nascimento;- Ele é Coercitivo, pois se imprime perante todos de forma forçada e compulsória. Assim, as regras sociais são respeitadas, seja a partir de sanções legais – como a legislação – ou costumeira.
De maneira geral, o fato social é uma instituição acima da nossa vontade individual. Um exemplo trazido pelo próprio Durkheim é o suicídio, que se tornou o tema principal do seu livro publicado em 1897. Neste ele analisa como a sociedade pode intervir em uma ação privada. A partir do uso de dados, ele define o que são as ações suicidas regulares dentro do coletivo e as que não são. As categorias encontradas foram: - Ato Egoísta: quando o suicídio é praticado apenas por uma vontade individual, que é maior do que a coletividade; - Ato Altruísta: de base social e ocorre quando há alguma crise, seja econômica e política, que estimula a ação. Um exemplo são os ativistas que realizam jejuns ou até ateiam fogo no próprio corpo para que suas causas sejam discutidas pela sociedade. - Ato Anômico: são os que se encontram fora da normalidade, de acordo com os dados recolhidos e analisados. Geralmente ocorrem devido a um acontecimento atípico na sociedade
Durkheim se colocava na figura do cientista imparcial, isento de opinião e sim um analista. Em As Regras do Método Sociológico, de 1895, ele desenvolveu os elementos que o auxiliariam na interpretação do seu objeto de estudos, que era a sociedade. Esta, portanto, está num nível acima do indivíduo, e precisa ser analisada com objetividade.
Os fatos sociais durkheimianos também possuíam categorias entre si. Ele definiu que existiam os:
- Fatos Sociais Normais – a palavra normal vem do latim e significa “de acordo com a regra” ou “com a norma”. Ou seja, algo considerado normal era aquele que possuía regularidade na sociedade, algo que ele obtinha a partir de estatísticas. Seriam esses fatos o trabalho, a educação, o próprio suicídio, entre outros.
- Fatos Sociais Patológicos – o significado dessa palavra de raiz grega é o “estudo do sofrimento”, portanto, esses fatos correspondem ao momento doente da sociedade que não faz parte do regulamento social normal. Aqui, a questão da incidência é fundamental, por isso quanto menos comum, mais impactante. É o que o autor descreve como anomia, isto é, “fora da regra”. Esse fato característico seria um problema para a sociedade, que sairia do seu curso devido a uma causa excepcional. Contudo, ele pondera que caso esse fato se tornasse recorrente, poderia ser deslocado para a definição de normal, já que seria incorporado coletivamente.
Além da classificação dos fatos, outros conceitos criados por Durkheim elucidam seu método, sobretudo as ideias de:
- Consciência individual – pertencente ao sujeito, e que para o autor é menor e menos importante que a coletiva. Envolve escolhas particulares, porém é influenciada pelo todo. Um exemplo é o ato de estudar, pois é grupal, contudo se a pessoa usa caderno ou computador para as suas anotações é uma escolha individual e indiferente ao todo.
- Consciência coletiva – parte de toda a sociedade, tem uma relevância maior, pois exerce um poder coercitivo em relação ao coletivo e influencia diretamente o indivíduo.
Uma das formas de se compreender e analisar a sociedade do presente é compará-la ao passado. Se o século XIX era marcado pelo desenvolvimento científico, as anteriores eram mais simples. É nesse momento que cria o conceito de Solidariedade, encontrado na obra Da divisão do trabalho social, de 1893. A palavra de origem latina é aplicada, aqui, no sentido jurídico de obrigação social um com os outros, isto é, uma organização social coordenada e mútua. Definiu, dessa forma, as:
- Solidariedade mecânica – que abrange sociedades menos complexas, nas quais o trabalho é dividido de maneira mais simples e facilmente resposto. Por exemplo: no período Neolítico quando uma pessoa encarregada de caçar os animais morria, outra ocuparia seu lugar sem grandes mudanças. É como se o sistema perdesse uma engrenagem que seria facilmente substituída.
- Solidariedade orgânica – era encontrada nas sociedades mais complexas, as de base capitalistas, modernas e urbanizadas, ou seja, a europeia oitocentista. Aqui, a exemplificação não vem da Física – mecânica – e sim da Biologia, uma das ciências mais celebradas do período. Neste organismo social, cada indivíduo tem sua função ao mesmo tempo em que faz parte de um grande coletivo. As formas de trabalho são mais complexas e poucos mutáveis ou substituíveis entre si. Dessa forma, ele diferenciava seu mundo do das sociedades primitivas, tanto da Antiguidade quando as que os europeus passaram a conhecer com a Neocolonização.
Durkheim criou todo um sistema de conceitos para analisar e interpretar a sociedade para entender a sua organização e características. Apesar de não fornecer soluções para os problemas sociais, pois acreditava que a posição de neutralidade absoluta era a única que um cientista poderia assumir, outros colegas contemporâneos iam além na interpretação, como veremos adiante.
Durkheim é o pai da Sociologia, foi quem iniciou a análise científica da sociedade buscando entender as mudanças e características da mesma. Ele é cobrado tanto pela sua metodologia e conceitos como em comparação aos outros sociólogos do mesmo período que formam a tríade da Sociologia Clássica: Max Weber e Karl Marx. Entender o contexto é fundamental, então retome as aulas de História.
1. (Enem 2016) A sociologia ainda não ultrapassou a era das construções e das sínteses filosóficas. Em vez de assumir a tarefa de lançar luz sobre uma parcela restrita do campo social, ela prefere buscar as brilhantes generalidades em que todas as questões são levantadas sem que nenhuma seja expressamente tratada. Não é com exames sumários e por meio de intuições rápidas que se pode chegar a descobrir as leis de uma realidade tão complexa. Sobretudo, generalizações às vezes tão amplas e tão apressadas não são suscetíveis de nenhum tipo de prova.
DURKHEIM, E. O suicídio: estudo de sociologia. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
O texto expressa o esforço de Émile Durkheim em construir uma sociologia com base na
a) vinculação com a filosofia como saber unificado.
b) reunião de percepções intuitivas para demonstração.
c) formulação de hipóteses subjetivas sobre a vida social.
d) adesão aos padrões de investigação típicos das ciências naturais.
e) incorporação de um conhecimento alimentado pelo engajamento político.
2. (Interbits 2017) Brasil vive momento de 'anomia', diz FHC
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso acredita que o Brasil vive um "momento de anomia" - estado que se caracteriza pela ausência de regras - e que é preciso "botar ordem na casa". "Há falta de sentido de organização e autoridade. Em toda a parte”. Questionado sobre o que faria se estivesse no lugar do presidente Michel Temer, FHC disse que "a essa altura, estaria considerando o futuro do Brasil e pensando bem: será que eu tenho condições de governar?". Na sequência, o tucano foi perguntado quanto tempo levaria para fazer essa reflexão. "Não muito. As coisas vão variar com muita velocidade, vão se mover com muita rapidez, eu acho. Sem julgar, mas em termos das condições do Brasil, estamos passando por um momento de... Vou falar em sociologuês, mas é simples... De anomia."
NUCCI, João Paulo. Brasil vive momento de ‘anomia’, diz FHC. O Estado de S.Paulo. 22 mai. 2017. Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-vive-momento-de-anomia-diz-fhc,70001804232> Acesso em 25 mai. 2017.
Considerando o contexto político apresentado na notícia acima, assinale a alternativa que apresenta, de forma correta, uma interpretação sociológica do contexto brasileiro.
a) O Brasil vive em uma anomia pela pobreza e desnutrição de sua população.
b) Ao utilizar o conceito de anomia, Fernando Henrique Cardoso faz referência a uma corrente de pensamento sociológico que tem origem no positivismo de Auguste Comte, que valoriza ideais como a ordem e o progresso.
c) Fernando Henrique Cardoso é um ex-presidente do Brasil, do PSDB. Sua análise da política tem como objetivo evitar que Lula chegue ao poder nas próximas eleições.
d) Há uma clara intenção do ex-presidente de criticar o atual presidente, Michel Temer. Assim, Fernando Henrique demonstra que seu objeto é assumir o país através de eleições indiretas.
e) Ao criticar a governabilidade de Michel Temer e defender o sentido de organização e autoridade, FHC demonstra que tem uma visão política baseada nas ideias de John Locke, ou seja, de que o homem é naturalmente livre.
Gabarito:
Questão 1 - [D] – Lembre-se que a análise científica é a base da teoria durkheimiana.
Questão 2 - [B] – Um dos conceitos criados pelo autor é a Anomia, que é o que se destaca por não ser “normal”, estar dentro das regras. Foque nos conceitos sociológicos para responder essa questão.
Durkheim – pai da Sociologia – aplicação da metodologia científica nos estudos sobre a sociedade. Fato Social: Exteriorizado, geral e coercitivo. As Regras do Método Sociológico, de 1895 - - Fatos Sociais Normais e Fatos Sociais Patológicos. Consciência individual e Consciência coletiva. Solidariedade mecânica e Solidariedade orgânica