Histórico da Sociologia Brasileira
Figura 1 - Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) - 1933 - Dornicke [Public domain], <a href="https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Escola_de_Sociologia_e_Pol%C3%ADtica_de_S%C3%A3o_Paulo_1.JPG">via Wikimedia Commons</a>
A Sociologia surgiu como disciplina no século XIX por causa das transformações ocorridas com a Revolução Industrial e as Revoluções Burguesas. Veremos as condições e contexto se desenvolvimento da Sociologia brasileira e os conceitos criados pelos principais intelectuais do ramo: Gilberto Freyre (1900-1987), Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), Caio Prado Júnior (1907-1990), Florestan Fernandes (1920-1995) e Darcy Ribeiro (1922-1997).
Quando se atesta que a Sociologia brasileira ganhou força a partir da década de 1930, não significa que o período anterior é esquecido. A questão é que as Escolas Normais e Universidades foram criadas depois de 1924 e 1925, oficializando a disciplina no país. Contudo, os estudos realizados anteriormente não são desprezados. Eles foram produzidos por, sobretudo, juristas que tinham contato com as teorias desenvolvidas por Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx. Além disso, o pensamento cientificista e evolucionista foi uma das bases epistemológicas que moveram os estudos sobre a sociedade. A temática global, a de comparação do Brasil com outras nações, a racial, a industrial e a urbana dominaram esses primeiros anos e se mantiveram como a institucionalização da disciplina. Esses pontos influenciaram os autores que desenvolveram a Sociologia no país.
O contexto, portanto, era o da República Velha, quando houve algumas tentativas de estabelecer o processo industrial que não foram satisfatórias. O sistema econômico se manteve agrário de exportação e toda a organização social o circundava. Porém, algumas mudanças estruturais eram claras e uma delas foi a Abolição de 1888. Desse momento em diante, as relações trabalhistas e sociais se transformaram já que a mão-de-obra livre exigia um novo tipo de gerenciamento de pessoas. Além disso, ficou escancarada a desigualdade e preconceito, pois os negros não foram integrados à sociedade. Muitos se mudaram para os centos urbanos após a libertação, onde haveria mais trabalho.
A partir da década de 1910 e 1920, os investimentos na indústria aumentaram e, com isso, as mudanças se tornaram mais latentes. Greves, manifestações e organizações sindicais surgiram, pois os operários reivindicavam a regulamentação do trabalho. Nesta mesma situação, os burgueses cresceram em importância e influência. Isto é, todo o processo vivido na Europa décadas antes, o Brasil passava naquele momento.
A Sociologia veio para entender essas mudanças e o povo brasileiro. Na década de 1930, o crescimento urbano era notável, os estudos sobre a identidade e a sua criação, eram incentivados. Um pouco antes, na Semana de Arte Moderna de 1922, o país experienciara um movimento artístico e intelectual, que foi um exemplo da efervescência política e cultural do momento. Em 1928, o Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade, incentivava o povo a olhar para si e parar de imitar o que vinha de fora. É importante entender que a Antropologia auxiliou profundamente a Sociologia brasileira, pois os estudos culturais estavam embrenhados nas análises da sociedade.
Figura 2 - Gilberto Freyre - 1945 - See page for author [Public domain], <a href="https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Gilberto_Freyre1.jpg">via Wikimedia Commons</a>
Gilberto de Mello Freyre
Foi um intelectual nascido em Recife, Pernambuco, que escreveu sobre a construção da nossa sociedade a partir do conceito das três raças – indígenas, brancos (europeus) e negros (africanos). Suas duas principais obras que tratam desse assunto são: Casa Grande e Senzala (1933) e Sobrados e Mucambos (1936).
Ao analisar o passado colonial, discutiu que houve problemas no processo, mas que a formação do Brasil ocorreu com a união das três raças, o que significaria a aceitação mútua através do casamento. Dessa maneira, desenvolveu a ideia de Democracia racial. A sua compreensão se dá por meio da comparação com a dos Estados Unidos. Lá, após a emancipação em 1863, a liberdade dos negros não foi assegurada. Em 1876 foram estabelecidas as Leis Jim Crow, que instituíram a segregação racial. O Brasil foi visto como um país em que o racismo era mais brando. Para Freyre, a dificuldade de ascensão social dos negros se relacionava à desigualdade e não ao preconceito.
Figura 3 - Sérgio Buarque de Holanda - 1957 - Brazilian National Archives [Public domain], <a href="https://commons.wikimedia.org/wiki/File:S%C3%A9rgio_Buarque_de_Holanda_(1957).tif">via Wikimedia Commons</a>
Sérgio Buarque de Holanda
Foi um historiador paulista que analisou o Brasil a partir do estudo do passado. Em Raízes do Brasil, sua célebre obra publicada em 1936, criou o conceito de homem cordial. Ele compara a colonização portuguesa, que teria sido circunstancial e sem planejamento prévio, com a espanhola, que tinha um projeto mais bem definido. Isso indicava o caminho que o Brasil percorreu até ali. A cordialidade do brasileiro se relacionava ao uso da emoção em primeiro lugar. Dessa forma, formaríamos uma sociedade emotiva, alegre e de fácil tato, ao mesmo tempo que seriamos imediatistas e pouco práticos. Essa era uma herança portuguesa que acompanhava o brasileiro. Além disso, foi uma relação confusa entre o que era público e privado, o que leva o brasileiro a colocar os interesses privados acima dos públicos.
Caio da Silva Prado Júnior
Foi um historiador paulista e escreveu grandes livros sobre economia e política, como Evolução política do Brasil (1933), Formação do Brasil Contemporâneo (1945), História Econômica do Brasil (1945), entre outros. Com forte base marxista, encontrava na teoria as explicações para entender os conflitos sociais. Assim como Buarque de Holanda, analisava o passado para entender o presente. Destacava o caráter capitalista do processo colonial como causa dos problemas enfrentados naquele momento. A expansão marítima portuguesa era o contexto no qual o país se desenvolveu. A exploração deixou uma herança difícil para o país e somente com compreensão dessa situação mudaria a mentalidade popular, que poderia romper esse ciclo.
Figura 4 - Florestan Fernandes - 1964 - Brazilian National Archives [Public domain], <a href="https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Florestan_Fernandes_em_confer%C3%AAncia_no_Museu_de_Belas_Artes_(1964).tif">via Wikimedia Commons</a>
Florestan Fernandes
Foi um dos principais sociólogos brasileiros e se graduou na Universidade de São Paulo em ciências sociais. Foi deputado federal a partir de 1987 e revolucionou o campo da sociologia no país. Produziu diversas obras e com A integração do negro na sociedade (1964) contestou a abordagem de Gilberto Freyre, a chamando de “mito da democracia racial”. O define assim porque a vê como uma narrativa que justificava a situação social no Brasil e que não tinha base na realidade. O autor argumenta que houve um processo secular de deterioração do negro que criou barreiras profundas que não se desintegraram com a assinatura da Lei Áurea. O racismo velado se entranhou na nossa sociedade de uma forma que precisaria ser exposto para que fosse realmente desintegrado.
Darcy Ribeiro
Foi um antropólogo mineiro que também participou da política como Ministro da Casa-Civil e da Educação no governo João Goulart, e Vice-Governador de Leonel Brizola no Rio de Janeiro. Auxiliou na construção das Leis de Diretrizes e Bases aprovada em 1996. Dedicou sua carreira à análise da população indígena e o porquê do seu silenciamento na História e nos estudos sociais do Brasil. Escreveu várias obras, com destaque para O povo brasileiro – a formação e o sentido do Brasil (1995), que sintetizou muitos dos seus trabalhos ao longo dos anos. Ele argumenta que existia a necessidade de se criar uma democracia social antes da racial para que a sociedade brasileira se tornasse mais igualitária. Também contestou a interpretação criada a partir da teoria das três raças pois, para ele, a mestiçagem era a raiz do Brasil, que criou sua identidade.
Os autores e conceitos apresentados aqui são os mais relevantes para a Sociologia Brasileira e recorrentemente são cobrados nos vestibulares. Façam uma análise da História e das suas teorias, pensando na ideia e no contexto, pois assim você conseguirá aprender, e não decorar, esse conteúdo.
1. (Udesc 2019) Leia o trecho a seguir:
“Não existe democracia racial efetiva, onde o intercâmbio entre indivíduos pertencentes a ‘raças’ distintas começa e termina no plano da tolerância convencionalizada. Esta pode satisfazer as exigências do bom-tom, de um discutível espírito cristão e da necessidade prática de ‘manter cada um no seu lugar’. Contudo, ela não aproxima realmente os homens senão na base da mera coexistência no mesmo espaço social e, onde isso chega a acontecer, da convivência restritiva, regulada por um código que consagra a desigualdade, disfarçando-a e justificando-a acima dos princípios de integração da ordem social democrática”.
Florestan Fernandes, 1960.
Florestan Fernandes se refere à ideia de “democracia racial” que, durante um período, foi considerada constitutiva da identidade nacional brasileira. Esta tese era caracterizada por:
a) pressupor uma miscigenação harmoniosa entre os diferentes grupos étnicos constitutivos da nação brasileira.
b) apregoar que representantes de todos os grupos étnicos deveriam ter representatividade política em âmbito legislativo.
c) promover a denúncia de práticas racistas contra negros, mulheres e indígenas.
d) reivindicar a instauração de processos e eventuais julgamentos dos responsáveis pelo processo de favelização nas grandes capitais brasileiras, a partir de fins do século XIX.
e) defender as candidaturas plurirraciais nos processos eleitorais, pós 1964.
2. (Enem PPL 2017) TEXTO I
A Resolução nº 7 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) passou a disciplinar o exercício do nepotismo cruzado, isto é, a troca de parentes entre agentes para que tais parentes sejam contratados diretamente, sem concurso. Exemplificando: o desembargador A nomeia como assessor o filho do desembargador B que, em contrapartida, nomeia o filho deste como seu assessor.
COSTA, W. S. Do nepotismo cruzado: características e pressupostos. Jusnavigandi, n. 950, 8 fev. 2006.
TEXTO II
No Brasil, pode-se dizer que só excepcionalmente tivemos um sistema administrativo e um corpo de funcionários puramente dedicados a interesses objetivos e fundados nesses interesses.
HOLANDA, S. B. Raízes do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1993.
A administração pública no Brasil possui raízes históricas marcadas pela
a) valorização do mérito individual.
b) punição dos desvios de conduta.
c) distinção entre o público e o privado.
d) prevalência das vontades particulares.
e) obediência a um ordenamento impessoal.
Gabarito:
Questão 1 - [A] – Florestan Fernandes analisou em sua obra A integração do negro na sociedade de classes que havia uma interpretação errônea do que se entendia como miscigenação, como se tivesse sido de forma harmoniosa. Assim, contestou a democracia racial de Gilberto Freyre.
Questão 2 - [D] – Sérgio Buarque de Holanda, em Raízes do Brasil, desenvolveu a ideia do homem cordial, que foi uma relação confusa entre o que era público e privado, o que leva o brasileiro a colocar os interesses privados acima dos públicos.
Sociologia Brasileira
- Gilberto Freyre (1900-1987)
Três raças – indígenas, brancos (europeus) e negros (africanos)
Casa Grande e Senzala (1933) e Sobrados e Mucambos (1936).
Democracia racial.
- Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982),
Raízes do Brasil (1936)
Homem cordial
- Caio Prado Júnior (1907-1990),
Evolução política do Brasil (1933), Formação do Brasil Contemporâneo (1945), História Econômica do Brasil (1945)
Base marxista
Caráter capitalista do processo colonial
- Florestan Fernandes (1920-1995)
A integração do negro na sociedade (1964)
“Mito da democracia racial”.
Processo secular de deterioração do negro
- Darcy Ribeiro (1922-1997).
O povo brasileiro – a formação e o sentido do Brasil (1995),
Democracia social
Identidade