(Enem 2006)
Depois de um bom jantar: feijão com carne-seca, orelha de porco e couve com angu, arroz-mole engordurado, carne de vento assada no espeto, torresmo enxuto de toicinho da barriga, viradinho de milho verde e um prato de caldo de couve, jantar encerrado por um prato fundo de canjica com torrões de açúcar, Nhô Tomé saboreou o café forte e se estendeu na rede. A mão direita sob a cabeça, à guisa de travesseiro, o indefectível cigarro de palha entre as pontas do indicador e do polegar, envernizados pela fumaça, de unhas encanoadas e longas, ficou-se de pança para o ar, modorrento, a olhar para as ripas do telhado.
Quem come e não deita, a comida não aproveita, pensava Nhô Tomé... E pôs-se a cochilar. A sua modorra durou pouco; Tia Policena, ao passar pela sala, bradou assombrada:
- Êêh! Sinhô! Vai drumi agora? Não! Num presta... Dá pisadêra e póde morrê de ataque de cabeça! Despois do armoço num far-má... mais despois da janta?!
Cornélio Pires. Conversas ao pé do fogo. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 1987.
Nesse trecho, extraído de texto publicado originalmente em 1921, o narrador
apresenta, sem explicitar juízos de valor, costumes da época, descrevendo os pratos servidos no jantar e a atitude de Nhô Tomé e de Tia Policena.
desvaloriza a norma culta da língua porque incorpora à narrativa usos próprios da linguagem regional das personagens.
condena os hábitos descritos, dando voz a Tia Policena, que tenta impedir Nhô Tomé de deitar-se após as refeições.
utiliza a diversidade sociocultural e linguística para demonstrar seu desrespeito às populações das zonas rurais do início do século XX.
manifesta preconceito em relação a Tia Policena ao transcrever a fala dela com os erros próprios da região.