(FUVEST/1999)
Começo a arrepender-me deste livro. Não que ele me canse; eu não tenho que fazer; e, realmente, expedir alguns magros capítulos para esse mundo sempre é tarefa que distrai um pouco da eternidade. Mas o livro é enfadonho, cheira a sepulcro, traz certa contração cadavérica; vício grave, e aliás ínfimo, porque o maior defeito deste livro és tu, leitor. Tu tens pressa de envelhecer, e o livro anda devagar; tu amas a narração direita e nutrida, o estilo regular e fluente, e este livro e o meu estilo são como os ébrios, guinam à direita e à esquerda, andam e param, resmungam, urram, gargalham, ameaçam o céu, escorregam e caem...
(Machado de Assis, MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS)
Tendo em vista o contexto das MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS, é correto afirmar que, nesse excerto,
as imagens que se referem ao próprio livro, mesmo exageradas, apontam para características que esse romance de fato apresenta.
ao ponderar a opinião do leitor, o narrador novamente evidencia o respeito e a consideração que tem por ele.
o movimento autocrítico põe em relevo, principalmente, a modéstia e a contenção característica do narrador.
o fato de o narrador dirigir-se diretamente ao leitor configura um momento de exceção no livro.
a atitude do narrador contradiz a constância e a persistência com que habitualmente executa seus projetos.