(FUVEST - 2021 - 1ª fase)
Romance LIII ou das Palavras Aéreas
Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
Ai, palavras, ai, palavras,
sois de vento, ides no vento,
no vento que não retorna,
e, em tão rápida existência,
tudo se forma e transforma!
Sois de vento, ides no vento,
e quedais, com sorte nova! (...)
Ai, palavras, ai, palavras
que estranha potência, a vossa!
Perdão podíeis ter sido!
-sois madeira que se corta,
-sois vinte degraus de escada,
-sois um pedaço de corda...
-sois povo pelas janelas,
cortejo, bandeiras, tropa...
Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
Éreis um sopro na aragem...
-sois um homem que se enforca!
Cecília Meireles, Romanceiro da Inconfidência.
A "estranha potência" que a voz lírica ressalta nas palavras decorre de uma combinação entre
fluidez nos ventos do presente e conteúdo fixo no passado.
forma abstrata no espaço e presença concreta na história.
leveza impalpável na arte e vigor nos documentos antigos.
sonoridade ruidosa nos ares e significado estável no papel.
lirismo irrefletido na poesia e peso justo dos acontecimentos.