(FUVEST - 2022 - 2ª fase)
O que me espanta não é a traição que dá na vista, não é a tolice que brilha em público: é a decência que se mantém, é a dignidade que se preserva, é a honradez que se resguarda, é o sacrifício obscuro e quotidiano que se continua. Eu lhe digo, porque tenho vivido em muitos cantos do Brasil e mexido com muita gente — eu posso lhe dizer que, entre milhares de homens tão diferentes de caráter e mesmo de idéias, sempre se tem conservado, através de todas as tribulações e contingências, um patrimônio comum. E você, Graciliano Ramos, faz parte deste nosso patrimônio.
O que senti vontade de lhe dizer hoje, e fica dito agora, é o seguinte: que tanto quanto eu, há milhares de pessoas no Brasil que não estão presentes ao banquete mas que desejam que você fique sabendo que estão ao seu lado. Conte conosco, não apenas na hora de comer e de beber, como também na hora de ter ódio de Julião Tavares, de lutar contra Julião Tavares — e de matar Julião Tavares.
Rubem Braga — “Discurso de um ausente”, mensagem do cronista a seu amigo Graciliano Ramos por ocasião do jantar em homenagem aos cinquenta anos do autor de Angústia.
a) Como os valores éticos descritos por Rubem Braga constituem a resistência (e logo a tensão) que forma o ponto de vista em Angústia?
b) Caracterize o perfil de Julião Tavares, de modo a explicar por que o cronista o considera um inimigo do “patrimônio” comum.