(UERJ 2019) Soneto de separao De repente do riso fez-se o pranto Silencioso e branco como a bruma E das bocas unidas fez-se a espuma E das mos espalmadas fez-se o espanto. De repente da calma fez-se o vento Que dos olhos desfez a ltima chama E da paixo fez-se o pressentimento E do momento imvel fez-se o drama. De repente, no mais que de repente Fez-se de triste o que se fez amante E de sozinho o que se fez contente. Fez-se do amigo prximo o distante Fez-se da vida uma aventura errante De repente, no mais que de repente. MORAES, Vincius de. Livro de Sonetos. So Paulo:Companhia das Letras, 2009 Uma srie de transformaes apresentada pelo verbofazeracompanhado da palavrase. Na cena construda no poema, essa estrutura lingustica produz o seguinte efeito:
(UERJ - 2019) O lbum de msicas Tropiclia ou Panis et circensis foi lanado em 1968. A fotografia que estampou sua capa foi realizada na casa de Oliver Perroy, fotgrafo da Editora Abril, em So Paulo. Cada um levou seus apetrechos, at um penico, comicamente usado por Rogrio Duprat como se fosse uma xcara. A imagem ficou to famosa que se tornou uma espcie de carto-postal do movimento tropicalista. Adaptado de f508.com.br. No contexto do final da dcada de 1960, o Tropicalismo, que causou polmicas com produes como a do lbum citado, tornou-se smbolo de
(UERJ - 2019) Soneto da hora final Ser assim, amiga: um certo dia Estando ns a contemplar o poente Sentiremos no rosto, de repente O beijo leve de uma aragem fria. Tu me olhars silenciosamente E eu te olharei tambm, com nostalgia E partiremos, tontos de poesia Para a porta de treva aberta em frente. Ao transpor as fronteiras do Segredo Eu, calmo, te direi: No tenhas medo E tu, tranquila, me dirs: S forte. E como dois antigos namorados Noturnamente tristes e enlaados Ns entraremos nos jardins da morte. No ttuloSoneto da hora final, para revelar o tema do poema, recorre-se figura de linguagem denominada:
(UERJ 2019) Um poema de Vinicius de Moraes A flutuao do gosto em relao aos poetas normal, como normal a sucesso dos modos de fazer poesia. Pelo visto, Vinicius de Moraes anda em baixa acentuada. Talvez o seu prestgio tenha diminudo porque se tornou cantor e compositor, levando a opinio a consider-lo mais letrista do que poeta. Mas deve ter sido tambm porque encarnou um tipo de poesia oposto a certas modalidades para as quais cada palavra tende a ser objeto autnomo, portador de maneira isolada (ou quase) do significado potico. Na histria da literatura brasileira ele um poeta de continuidades, no de rupturas; e o nosso um tempo que tende ruptura, ao triunfo do ritmo e mesmo do rudo sobre a melodia, assim como tende a suprimir as manifestaes da afetividade. Ora, Vinicius melodioso e no tem medo de manifestar sentimentos, com uma naturalidade que deve desgostar as poticas de choque. Por vezes, ele chega mesmo a cometer o pecado maior para o nosso tempo: o sentimentalismo. Isso lhe permitiu dar estatuto de poesia a coisas, sentimentos e palavras extrados do mais singelo cotidiano, do coloquial mais familiar e at piegas, de maneira a parecer muitas vezes um seresteiro milagrosamente transformado em poeta maior. Joo Cabral disse mais de uma vez que sua prpria poesia remava contra a mar da tradio lrica de lngua portuguesa. Vinicius seria, ao contrrio, algum integrado no fluxo da sua corrente, porque se disps a atualizar a tradio. Isso foi possvel devido maestria com que dominou o verso, jogando com todas as suas possibilidades. Ele consegue ser moderno usando metrificao e cultivando a melodia, com uma imaginao renovadora e uma liberdade que quebram as convenes e conseguem preservar os valorescoloquiais. Rigoroso como Olavo Bilac, fluido como o Manuel Bandeira dos versos regulares, terra a terra como os poemas conversados de Mrio de Andrade, esse mestre do soneto e da crnica um raro malabarista. ANTONIO CANDIDO Adaptado deTeoria e debate,n 49. So Paulo: Fundao Perseu Abramo, out-dez, 2001. A articulao do primeiro com o segundo pargrafo revela o seguinte eixo principal da argumentao do crtico: