(UERJ 2019)
Soneto de separação
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
MORAES, Vinícius de. Livro de Sonetos. São Paulo: Companhia das Letras, 2009
Uma série de transformações é apresentada pelo verbo fazer acompanhado da palavra se.
Na cena construída no poema, essa estrutura linguística produz o seguinte efeito:
apagamento dos parceiros da relação.
esquecimento da sensação de perda.
neutralização dos espaços de conflito.
indefinição dos momentos de despedida.