(ENEM - 2018 - PROVA AMARELA)
A Casa de Vidro
Houve protestos.
Deram uma bola a cada criança e tempo para brincar. Elas aprenderam malabarismos incríveis e algumas viajavam pelo mundo exibindo sua alegre habilidade. (O problema é que muitos, a maioria, não tinham jeito e eram feios de noite, assustadores. Seria melhor prender essa gente – havia quem dissesse.)
Houve protestos.
Aumentaram o preço da carne, liberaram os preços dos cereais e abriram crédito a juros baixos para o agricultor. O dinheiro que sobrasse, bem, digamos, ora o dinheiro que sobrasse!
Houve protestos.
Diminuíram os salários (infelizmente aumentou o número de assaltos) porque precisamos combater a inflação e, como se sabe, quando os salários estão acima do índice de produtividade eles se tornam altamente inflacionários, de modo que.
Houve protestos.
Proibiram os protestos.
E no lugar dos protestos nasceu o ódio. Então surgiu a Casa de Vidro, para acabar com aquele ódio.
ÂNGELO, I. A casa de vidro. São Paulo: Círculo do Livro, 1985
Publicado em 1979, o texto compartilha com outras obras da literatura brasileira escritas no período as marcas do contexto em que foi produzido, como a
referência à censura e à opressão para alegorizar a falta de liberdade de expressão característica da época.
valorização de situações do cotidiano para atenuar os sentimentos de revolta em relação ao governo instituído.
utilização de metáforas e ironias para expressar um olhar crítico em relação à situação social e política do país.
tendência realista para documentar com verossimilhança o drama da população brasileira durante o Regime Militar.
sobreposição das manifestações populares pelo discurso oficial para destacar o autoritarismo do momento histórico.