(ENEM - 2018 - PROVA AMARELA)
O trabalho não era penoso: colar rótulos, meter vidros em caixas, etiquetá-las, selá-las, envolvê-Ias em papel celofane, branco, verde, azul, conforme o produto, separá-las em dúzias… Era fastidioso. Para passar mais rapidamente às oito horas havia o remédio: conversar. Era proibido, mas quem ia atrás de proibições? O patrão vinha? Vinha o encarregado do serviço? Calavam o bico, aplicavam-se ao trabalho. Mal viravam as costas, voltavam e taramelar. As mãos não paravam, as línguas não paravam. Nessas conversas intermináveis, do linguagem solta e assuntos crus, Loniza se completou. Isabela, Afonsina, Idália, Jurete, Deolinda — foram mestras. O mundo acabou de se desvendar. Leniza perdeu o tom ingênuo que ainda podia ter. Ganhou um jogar de corpo que convida, um quebrar de olhos que promete tudo, à toa, gratuitamente. Modificou-se o timbre de sua voz. Ficou mais quente. A própria inteligência se transformou. Tornou-se mais aguda, mais trepidante.
REBELO,M. A estrela sobe. Rio de Janeiro: José Olympio, 2009.
O romance, de 1939, traz à cena tipos e situações que espelham o Rio de Janeiro daquela década. No fragmento, o narrador delineia esse contexto centrado no
julgamento da mulher fora do espaço doméstico.
relato sobre as condições de trabalho do Estado Novo.
destaque a grupos populares na condição de protagonistas.
processo de inclusão do palavrão nos hábitos de linguagem.
vínculo entre as transformações urbanas e os papéis femininos.