(ENEM - 2021) No que Pelino fosse qumico, longe disso: mas era sbio, era gramtico. Ningum escreviaem Tubiacanga que no levasse bordoada do Capito Pelino, e mesmo quando se falava em algum homem notvel l no Rio, ele no deixava de dizer: No h dvida O homem tem talento, mas escreve: um outro, de resto... E contraa os lbios como se tivesse engolido alguma cousa amarga. Toda a vila de Tubiacanga acostumou-se a respeitar o solene Pelino, que corrigia e emendava as maiores glrias nacionais. Um sbio... Ao entardecer, depois de ler um pouco o Sotero, o Candido de Figueiredo ou o Castro Lopes, e de ter passado mais uma vez a tintura nos cabelos, ovelho mestre-escola saa vagarosamente de casa, muito abotoado no seu palet de brim mineiro, e encaminhava-se para a botica do Bastos a dar dous dedos de prosa. Conversar um modo de dizer, porque ea Pelino avaro de palavras, limitando-se to-somente a ouvir. Quando, porm, dos lbios de algum escapava a menor incorreo de linguagem, intervinha e emendava. Eu asseguro, dizia o agente do Correio, que... Por a, o mestre-escola intervinha com mansuetude evanglica: No diga asseguro, Senhor Bernardes; em portugus garanto. E a conversa continuava depois da emenda, para ser de novo interrompida por uma outra. Por essas e outras, houve muitos palestradores que se afastaram, mas Pelino, indiferente, seguro dos seus deveres, continuava o seu apostolado de vernaculismo. BARRETO, L. A Nova Califrnia. Disponvel em: www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 24 jul. 2019. Do ponto de vista lingustico, a defesa da norma-padro pelo personagem caracteriza-se por
(ENEM - 2021) TEXTO I Correu sala dos retratos, abriu o piano, sentou-se e espalmou as mos no teclado. Comeou a tocar alguma coisa prpria, uma inspirao real e pronta, uma polca, uma polca buliosa, como dizem os anncios. Nenhuma repulsa da parte do compositor; os dedos iam arrancando as notas, ligando-as, meneando-as; dir-se-ia que a musa compunha e bailava a um tempo. [...] Compunha s, teclando ou escrevendo, sem os vos esforos da vspera, sem exasperao, sem nada pedir ao cu, sem interrogar os olhos de Mozart. Nenhum tdio. Vida, graa, novidade, escorriam-lhe da alma como de uma fonte perene. ASSIS, M.Um homem clebre. Disponvel em: www.biblio.com.br. Acesso em: 2 jun. 2019. TEXTO II Um homem clebreexpe o suplcio do msico popular que busca atingir a sublimidade da obra-prima clssica, e com ela a galeria dos imortais, mas que trado por uma disposio interior incontrolvel que o empurra implacavelmente na direo oposta. Pestana, clebre nos saraus, sales, bailes e ruas do RIo de Janeiro por suas composies irresistivelmente danantes, esconde-se dos rumores sua volta num quarto povoado de cones da grande msica europeia, mergulha nas sonatas do classicismo vienense, prepara-se para o supremo salto criativo e, quando d por si, o autor de mais uma inelutvel e saltitante polca. WISNIK, J. M. Machado maxixe: o caso Pestana.Teresa: revista de literatura brasileira, 2004 (adaptado). O conto de Machado de Assis faz uma referncia velada ao maxixe, gnero musical inicialmente associado escravido e mestiagem. No texto II, o conflito do personagem em compor obras do gnero representativo da
(ENEM - 2021) Devagar, devagarinho Desacelerar preciso. Acelerar no preciso. Afobados e voltados para o prprio umbigo, operamos, automatizados, falas robticas e silncios glaciais. Ilustra bem esse estado de esprito a msica Sinal fechado(1969), de Paulinho da Viola. Trata-se da histria de dois sujeitos que se encontram inesperadamente em um sinal de trnsito. A conversa entre ambos, porm, se deu rpida e rasteira. Logo, os personagens despedem, com a promessa de se verem em outra oportunidade. Percebe-se um registro de comunicao vazia e superficial, cuja tnica foi o contato ligeiro e superficial construdo pelos interlocutores: Ol, como vai? / Eu vou indo e voc, tudo bem? / Tudo bem, eu vou indo correndo, / pegar meu lugar no futuro. E voc? / Tudo bem, eu vou indo em busca de un sono / tranquilo, quem sabe? / Quanto tempo .. / Pois , quanto tempo... / Me perdoa a pressa / a alma dos nossos negcios / Oh No tem de qu. / Eu tambm s ando a cem. O culto velocidade, no contexto apresentado, se coloca como fruto de um imediatismo processual que celebra o alcance dos fins sem dimensionar a qualidade dos meios necessrios para atingir determinado propsito. Tal conjuntura favorece a lei do menor esforo - a comodidade - e prejudica a lei do maior esforo - a dignidade. Como modelo alternativo cultura fast, temos o movimento slow life, cujo proposito, resumidamente, conscientizar as pessoas de que a pressa inimiga de perfeio e do prazer, buscando assim reeducar seus sentidos para desfrutar melhor os abores da vida. SILVA, M. F, L Boletim UFMG, n 1749, set 2011 (adaptado) Nesse artigo de opinio, a apresentao da letra da cano Sinal fechado uma estratgia argumentativa que visa sensibilizar o leitor porque
(ENEM - 2021) A histria do futebol brasileiro contm, ao longo de um sculo, registros de episdios racistas. Eis o paradoxo: se, de um lado, a atividade futebolstica era depreciada aos olhos da boa sociedade como profisso destinada aos pobres, negros e marginais, de outro, achava-se investida do poder de representar e projetar a nao em escala mundial. A Copa do Mundo no Brasil, em 1950, viria a se constituir, nesse sentido, em uma rara oportunidade. Contudo, na deciso contra o Uruguai sobreveio o inesperado revs. As crnicas esportivas elegiam o goleiro Barbosa e o defensor Bigode como bodes expiatrios, descarregando nas costas dos jogadores os prejuzos da derrota. Uma chibata moral, eis a setena proferida no tribual dos brancos. Nos anos 1970, por no atender s expectativas normativas suscitadas pelo esteretipo do bom negro, Paulo Csar Lima foi classificado como jogador-problema. Ele esboava a revolta da chibata no futebol brasileiro. Enquanto Barbosa e Bigode, sem alternativa, suportaram o linchamento moral na derrota de 1950, Paulo Csar contra-atacava os que pretendiam conden-lo pelo insucesso de 1974. O jogador assumia as cores e as causas defendidas pela esquadra dos pretos em todas as esferas da vida social. Sinto na pele esse racismo subjacente, revelou imprensa francesa: Isto , ningum ousa pronunciar a palavra racismo. Mas posso garantir que ele existe, mesmo na Seleo Brasileira. Sua ousadia consistiu em pronunciar a palavra interdita no espao simblico do discurso oficial para reafirmar o mito da democracia racial. Disponvel em: https://observatorioracialfutebol.com.br. Acesso em: 22 jun. 2019 (adaptado). O texto atribui o enfraquecimento do mito da democracia racial no futebol
(ENEM - 2021) MEIRELLES, V. Moema. leo sobre tela, 129 cm x 190 cm. Masp, So Paulo, 1866. Disponvel em: www.masp.art.br. Acesso em: 13 ago. 2012 (adaptado). Nessa obra, que retrata uma cena de Caramuru, clebre poema pico brasileiro, a filio esttica romntica manifesta-se na
(ENEM - 2021) Coincidindo com o Dia Internacional dos Direitos da Infncia, foram apresentados diversos trabalhos que mostram as mudanas que afetam a vida das crianas. Um desses estudos compara o que sonham e brincam as crianas hoje em relao s dos anos 1990. E o que se descobriu que as crianas tm agora menos lazer e esto mais sobrecarregadas por deveres e atividades extracurriculares do que as de 25 anos atrs. As crianas de hoje no s dedicam menos tempo para brincar, como tambm, quando brincam, a maioria no o faz com outras crianas no parque, na rua ou na praa, mas em casa e muitas vezes sozinhas. E j no brincam tanto com brinquedos, mas com aparelhos eletrnicos, entre os quais predomina o jogo individual com a mquina. OLIVIA, M. P. O direito das crianas ao lazer... e a crescer sem carncias.El Pas, 20 nov. 2015(adaptado). O texto indica que as transformaes nas experincias ldicas na infncia
(ENEM - 2021) Os linguistas tem notado expanso do tratamento informal. Tenho 78 anos e devia ser tratado por senhor, mas meus alunos jovens me chamam de voc, diz o professor Ataliba Castilho, aparentemente sem se incomodar com a informalidade, inconcebivel em seus tempos de estudante. O voc, porm, no reinar sozinho. O TUpredomina em Porto Alegre e convive como o voc no Rio de Janeiro e em Recife, enquanto voc o tratamento predominante em Curitiba, Belo horizonte, So Paulo e Salvador. O tu j era mais prximo e menos formal que voc nas quase 500 cartas do acervo online de uma instituio universitria, quase todas de poetas, polticos e outras personalidades do final do sculo XIX e incio do sculo XX. No texto,constata-se que os usos depronomes variaram ao longo do tempo e que atualmente tm empregosdiversos nas regies do Brasil. Esse processo revela que
(ENEM - 2021) O solo, A morte do Cisne, criado em 1905 pelo russo Mikhial Fokine a partir da msica do francs Camile Saint-Saens, retrata o ltimo vo do cisne antes de morrer. Na verso original, uma bailarina com figurino impecavelmente branco e na ponta dos ps interpreta toda a agonia da ave se debatando at desfalecer. Em 2012, John Lennon da Silva, de 20 anaos, morador do bairro de So Mateus, na Zona Leste de So Paulo, elaborou um novo jeito de danar a coriografia imoortalizada pela bailarina Anna Pavlova. No lugar de col e das sapatilhas, vestiu cala jeans, camiseta e tnis. Em vez de bal, trouxe o estilo popping do street dance.Sua apresentao inovadora, A morte do Cisne, que foi ao ar no programa se ela dana eudano, virou Hit no YouTube. Disponvel em: www.correiobraziliense.com.br. Acesso em: 18 jun. 2019 (adaptado). A forma original de John Lennon da Silva reinterpretar a coreografia A morte do Cisne demonstra que
(ENEM - 2021) Seus primeiros anos de detendo foram difceis; aos poucos entendeu como o sistema funciona. Apanhou dezenas de vezes, teve o crnio esmagado, o maxilar deslocado, braos e pernas quebrados; por fim, um dia ficou lesionado da perna quando foi jogado da laje de um pavilho. Nem todas as vezes ele soube por que apanhou, muito menos da ltima, quando foi deixado para morrer, mas sobreviveu. Seu corpo, modo no inferno, aguarda o fim dos seus dias. J no questiona mais. Obedece. Cumpre as ordens. Baixa a cabea e se retira. Apanha, s vezes com motivo, s vezes sem. Por onde passou, derramaram seu sangue. Seu rastro pode ser seguido. Intriga ter sobrevivido durante tantos anos.Pouqussimos chegaram terceira idade encarcerados. MAIA, A. P. Assim na terra como embaixo da terra. Rio de Janeiro:Record, 2017. A narrativa concentra sua fora expressiva no manejo de recursos formais e numa representao ficcional que
(ENEM - 2021) O senhor pensa que s porque o deixaram morar neste pas pode logo ir fazendo o que quer? Nunca ouviu falar num troo chamado autoridades constitudas? No sabe que tem de conhecer as leis do pas? No sabe que existe uma coisa chamada Exrcito Brasileiro, que o senhor tem de respeitar? Que negcio esse? [...] Eu ensino o senhor a cumprir a lei, ali no duro: dura lex! Seus filhos so uns moleques e outra vez que eu souber que andaram incomodando o General, vai tudo em cana. Morou? Sei como tratar gringos feito o senhor. [...] Foi ento que a mulher do vizinho do General interveio: Era tudo que o senhor tinha a dizer a meu marido? O delegado apenas olhou-a, espantado com o atrevimento. Pois ento fique sabendo que eu tambm sei tratar tipos como o senhor. Meu marido no gringo nem meus filhos so moleques. Se por acaso importunaram o General, ele que viesse falar comigo, pois o senhor tambm est nos importunando. E fique sabendo que sou brasileira, sou prima de um Major do Exrcito, sobrinha de um Coronel, e filha de um General! Morou? Estarrecido, o delegado s teve fora para engolir em seco e balbuciar humildemente: Da ativa, minha senhora? SABINO, F. A mulher do vizinho. In: Os melhores contos. Rio de Janeiro: Record, 1986. A representao do discurso intimidador engendrada no fragmento responsvel por
(ENEM - 2021) Disponvel em: www.deskgram.org. Acesso em: 12 dez. 2018 (adaptado). A associao entre o texto verbal e as imagens da garrafa e do co configura recurso expressivo que busca
(ENEM - 2021) HENFIL. Disponvel em: https://medium.com. Acesso em: 29 out. 2018 (adaptrado). Nessa tirinha, produzida na dcada de 1970, os recursos verbais e no verbais sinalizam a finalidade de
(ENEM - 2021) A crise dos refugiados imortalizada para sempre no fundo do mar TAYLOR J.C.A balsa de Lampedusa.Instalao Musei Atlntico. Lanzarote, Canrias, 2016 (detalhe) A balsa de Lampedusa, nome da obra de Taylor, que abre este post, uma das instalaes criadas por ele para compor o acervo do primeiro museu submarino da Europa, o Museu Atlntico, localizado em Lanzarote, uma das ilhas do arquiplago das Canrias. Lampedusa o nome da ilha italiana onde a grande maioria dos refugiados que saem da frica ou de pases como Sria, Lbano e Iraque, tenta chegar para conseguir asilo no continente europeu. As esculturas do Museu Atlntico ficam a 14 metros de profundidade, nas guas cristalinas de Lanzarote Na balsa, esto dez pessoas. Todas tm no rosto a expresso do abandono. Entre elas, h algumas crianas. Uma delas, uma menina debruada sobre a beira do bote, olha sem esperana o horizonte. A imagem to forte, que dispensa qualquer palavra. Exatamente o papel da arte. Disponvel em https://conexaoplaneta.com.br/. Acesso em 22 jun, 2019 (adaptado) Alm de apresentar ao pblico a obra A balsa de Lampedusa, essa reportagem cumpre, paralelamente, a funo de chamar a ateno para
(ENEM - 2021) Intenso e original, Son of Saul retrata horror do holocausto Centenas de filmes sobre o holocausto j foram produzidos em diversos pases do mundo, mas nenhum to intenso como o hngaro Son of Saul, do estreante em longa-metragens Lszl Nemes, vencedor do Grande Prmio do Jri no ltimo Festival de Cannes. Ao contrrio da grande maioria das produes do gnero, que costuma oferecer uma variedade de informaes didticas e no raro cruza diferentes pontos de vista sobre o horror do campo de concentrao, o filme acompanha apenas um personagem. Ele Saul (Gza Rhrig), um dos encarregados de conduzir as execues de judeus como ele que, por um dia e meio, luta obssessivamente para que um menino j morto que pode ou no ser seu filho tenha um enterro digno e no seja simplesmente incinerado. O acompanhamento da jornada desse prisioneiro no sentido mais literal que o cinema pode proporcionar: a cmera est o tempo todo com o personagem, seja por sobre seus ombros, seja com um closeem primeiro plano ou em sua viso subjetiva. O que se passa ao seu redor secundrio, muitas vezes desfocado. Saul percorre diferentes divises de Auschwitz procura de um rabino que possa conduzir o enterro da criana, e por isso pouco se envolve nos planos de fuga que os companheiros tramam e, quando o faz, geralmente atrapalha. Voc abandonou os vivos para cuidar de um morto, acursa um deles. Ver toda essavia crucis por vezes duro e exige certa entrega do espectador, mas certamente daquelas experincias cinematogrficas que permanecem na cabea por muito tempo. O longa j est sendo apontado como o grande favorito ao Oscar de filme estrangeiro. Se levar a estatueta, certamente no faltar quem diga que a Academia tem uma preferncia por que aborda a 2 Guerra. Por mais que exista uma dose de verdade na afirmao, premiar uma abordagem to ousada e radical como Son of Saul no deixaria de ser um passo frente dos volantes. Carta Capital,n 873, 22out 2015. A resenha , normalmente, um texto de base argumentativa. Na resenha do filme Son of Saul, o trecho da sequncia argumentativa que se constitui como opinio implcita
(ENEM - 2021) Sinh Se a dona se banhou Eu no estava l Por Deus Nosso Senhor Eu no olhei Sinh Estava l na roa Sou de olhar ningum No tenho mais cobia Nem exergo bem Para que me pr no tronco Para que me aleijar Eu juro a vosmec Que nunca vi Sinh [...] Por que talhar meu corpo Eu no olhei Sinh Para que vosminc Meus olhos furar Eu choro em iorub Mas oro por Jesus Para que que vassunc Me tira a luz. CHICO BUARQUE; JOO BOSCO. Chico. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2011 (fragmento). No fragmento da letra da cano, o vocabulrio empregado e a situao retratada so relevantes para o patrimnio lingustico e identitrio do pas, na medida em que