(FUVEST 2014)
Revelação do subúrbio
Quando vou para Minas, gosto de ficar de pé, contra a vidraça do carro*,
vendo o subúrbio passar.
O subúrbio todo se condensa para ser visto depressa,
com medo de não repararmos suficientemente
em suas luzes que mal têm tempo de brilhar.
A noite come o subúrbio e logo o devolve,
ele reage, luta, se esforça,
até que vem o campo onde pela manhã repontam laranjais
e à noite só existe a tristeza do Brasil.
Carlos Drummond de Andrade, Sentimento do mundo, 1940.
(*) carro: vagão ferroviário para passageiros.
Segundo o crítico e historiador da literatura Antonio Candido de Mello e Souza, justamente na década que presumivelmente corresponde ao período de elaboração do livro a que pertence o poema, o modo de se conceber o Brasil havia sofrido “alteração marcada de perspectivas”. A leitura do poema de Drummond permite concluir corretamente que, nele, o Brasil não mais era visto como país
agrícola (fornecedor de matéria-prima), mas como industrial (produtor de manufaturados).
arcaico (retardatário social e economicamente) mas, sim, percebido como moderno (equiparado aos países mais avançados).
provinciano (caipira, localista) mas, sim, cosmopolita (aberto aos intercâmbios globais).
novo (em potência, por realizar-se), mas como subdesenvolvido (marcado por pobreza e atrofia).
rural (sobretudo camponês), mas como suburbano (ainda desprovido de processos de urbanização).