(UNESP - 2021 - 2ª FASE)
Leia o trecho do ensaio “As mutações do poder e os limites do humano”, de Newton Bignotto, para responder a questão.
A modernidade se construiu a partir do Renascimento à luz da famosa asserção do filósofo italiano Pico della Mirandola em seu Discurso sobre a dignidade do homem (1486), segundo o qual fomos criados livres e com o poder de escolher o que desejamos ser. Diferentemente dos outros seres, o homem pode constituir a própria face e transitar pelos caminhos mais elevados, ou degenerar até o nível inferior das bestas.
Para Pico della Mirandola, o homem é um ser autoconstruído, e, por isso, não podemos atribuir a forças transcendentes nem os sucessos nem os fracassos. A liberdade para forjar sua própria natureza é um dom que implica riscos. Se com frequência preferimos olhar apenas para a força de uma vontade, que decidiu explorar o mundo com as ferramentas da razão, desde a era do Barroco sabemos que o real comporta um lado escuro, que não pode ser simplesmente esquecido. Ao lado do racionalismo triunfante, sempre houve um grito de alerta quanto às trevas que rondavam as sociedades modernas.
O século XX viu essas trevas ocuparem o centro da cena mundial e enterrou para sempre a ideia de que o progresso da civilização iria nos livrar de nossas fraquezas e defeitos. O século da técnica e dos avanços espetaculares da ciência foi também o século dos massacres e do aparecimento da morte em escala industrial. Tudo se passa como se a partir de agora não pudéssemos mais esquecer da besta, que Pico della Mirandola via como uma das possibilidades de nossa natureza. O monstro, que rondava a razão, e que por tanto tempo pareceu poder ser por ela derrotado, aproveitou-se de muitas de suas conquistas para criar uma nova identidade, que nos obriga a conviver com a barbárie no seio mesmo de sociedades que tanto contribuíram para criar a imagem iluminada do Ocidente.
(Adauto Novaes (org.). Mutações, 2008. Adaptado.)
Dêiticos: expressões linguísticas cuja interpretação depende da pessoa, do lugar e do momento em que são enunciadas. Por exemplo, “eu” designa a pessoa que fala “eu”. Expressões como “aqui”, “hoje” devem ser interpretadas em função de onde e em que momento se encontra o locutor, quando diz “aqui” e “hoje”.
(Ernani Terra. Leitura do texto literário, 2014. Adaptado.)
Verifica-se a ocorrência de dêitico no seguinte trecho:
“O século da técnica e dos avanços espetaculares da ciência foi também o século dos massacres e do aparecimento da morte em escala industrial.” (3º parágrafo)
“Diferentemente dos outros seres, o homem pode constituir a própria face e transitar pelos caminhos mais elevados, ou degenerar até o nível inferior das bestas.” (1º parágrafo)
“A liberdade para forjar sua própria natureza é um dom que implica riscos.” (2º parágrafo)
“Ao lado do racionalismo triunfante, sempre houve um grito de alerta quanto às trevas que rondavam as sociedades modernas.” (2º parágrafo)
“Tudo se passa como se a partir de agora não pudéssemos mais esquecer da besta, que Pico della Mirandola via como uma das possibilidades de nossa natureza.” (3º parágrafo)