(FUVEST - 2003 - 1a Fase)
Os leitores estarão lembrados do que o compadre dissera quando estava a fazer castelos no ar a respeito do afilhado, e pensando em dar-lhe o mesmo ofício que exercia, isto é, daquele arranjei-me, cuja explicação prometemos dar. Vamos agora cumprir a promessa.
Se alguém perguntasse ao compadre por seus pais, por seus parentes, por seu nascimento, nada saberia responder, porque nada sabia a respeito. Tudo de que se recordava de sua história reduzia-se a bem pouco. Quando chegara à idade de dar acordo da vida achou-se em casa de um
barbeiro que dele cuidava, porém que nunca lhe disse se era ou não seu pai ou seu parente, nem tampouco o motivo por que tratava da sua pessoa. Também nunca isso lhe dera cuidado, nem lhe veio a curiosidade de indagá-lo.
Esse homem ensinara-lhe o ofício, e por inaudito milagre também a ler e a escrever. Enquanto foi aprendiz passou em casa do seu... mestre, em falta de outro nome, uma vida que por um lado se parecia com a do fâmulo*, por outro com a do filho, por outro com a do agregado, e que afinal não era senão vida de enjeitado, que o leitor sem dúvida já adivinhou que ele o era. A troco disso dava-lhe o mestre sustento e morada, e pagava-se do que por ele tinha já feito.
(*) fâmulo: empregado, criado
(Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um sargento de milícias)
A condição social de agregado, referida no excerto, caracteriza também a situação de
Juliana, na casa de Jorge e Luísa (O primo Basílio).
D. Plácida, na casa de Quincas Borba (Memórias póstumas de Brás Cubas).
Leonardo (filho), na casa de Tomás da Sé (Memórias de um sargento de milícias).
Joana, na casa de Jorge e Luísa (O primo Basílio).
José Manuel, na casa de D. Maria (Memórias de um sargento de milícias).