(FUVEST - 2020 - 1ª fase)
Hoje fizeram o enterro de Bela. Todos na Chácara se convenceram de que ela estava morta, menos eu. Se eu pudesse não deixaria enterrá‐la ainda. Disse isso mesmo a vovó, mas ela disse que não se pode fazer assim. Bela estava igualzinha à que ela era no dia em que chegou da Formação, só um pouquinho mais magra.
Todos dizem que o sofrimento da morte é a luta da alma para se largar do corpo. Eu perguntei a vovó: “Como é que a alma dela saiu sem o menor sofrimento, sem ela fazer uma caretinha que fosse?”. Vovó disse que tudo isso é mistério, que nunca a gente pode saber essas coisas com certeza. Uns sofrem muito quando a alma se despega do corpo, outros morrem de repente sem sofrer.
Helena Morley, Minha Vida de Menina.
Perguntas
Numa incerta hora fria
perguntei ao fantasma
que força nos prendia,
ele a mim, que presumo
estar livre de tudo
eu a ele, gasoso,
(...)
No voo que desfere
silente e melancólico,
rumo da eternidade,
ele apenas responde
(se acaso é responder
a mistérios, somar‐lhes
um mistério mais alto):
Amar, depois de perder.
Carlos Drummond de Andrade, Claro Enigma.
As perguntas da menina e do poeta versam sobre a morte. É correto afirmar que
ambos guardam uma dimensão transcendente e católica, de origem mineira.
ambos ouvem respostas que lhes esclarecem em definitivo as dúvidas existenciais.
a menina mostra curiosidade acerca da morte como episódio e o poeta especula o sentido filosófico da morte.
a menina está inquieta por conhecer o destino das almas, enquanto o poeta critica o ceticismo.
as duas respostas reforçam os mistérios da vida ao acolherem crenças populares.