(ITA - 2007 - 1 FASE)Cemitrio PernambucanoNesta te
(ITA - 2007 - 1ª FASE)
Cemitério Pernambucano
Nesta terra ninguém jaz,
pois também não jaz um rio
noutro rio, nem o mar
é cemitério de rios.
Nenhum dos mortos daqui
vem vestido de caixão.
Portanto, eles não se enterram,
são derramados no chão.
Vêm em redes de varandas
abertas ao sol e à chuva.
Trazem suas próprias moscas.
O chão lhes vai como luva.
Mortos ao ar-livre, que eram,
hoje à terra-livre estão.
São tão da terra que a terra
nem sente sua intrusão.
O poema acima consta do livro Paisagem com figuras, de João Cabral de Melo Neto, publicado em 1955. Este texto mostra com clareza duas das marcas mais recorrentes da obra de João Cabral, que são:
a presença do realismo de cunho social, que se nota nas referências ao mundo nordestino, aliada à racionalidade típica de boa parte da poesia moderna.
a presença do realismo de cunho social, mas associado a uma visão do mundo ainda herdeira do Romantismo, o que se nota pela presença das imagens naturais.
a preocupação em descrever a paisagem nordestina e a intenção de reproduzir a fala popular.
o caráter mais racional e sóbrio da poesia, que evita o derramamento emocional, aliado a certa herança realista no que diz respeito à valorização da cultura brasileira.
O rigor construtivo do poema, que deixa de lado a emoção e as convenções românticas, o que faz desse texto um bom exemplo de poesia metalingüística.
