ENEM

ITA

IME

FUVEST

UNICAMP

UNESP

UNIFESP

UFPR

UFRGS

UNB

VestibularEdição do vestibular
Disciplina

(ITA - 2007 - 1 FASE)TEXTO 1O ritual brasileiro do

Português | Gramática | pontuação | emprego de parêntesis
Português | Interpretação de texto | noção de texto | fatores linguísticos e pragmáticos
ITA 2007ITA PortuguêsTurma ITA-IME

(ITA - 2007 - 1ª FASE)

TEXTO 1

O ritual brasileiro do trote

1Estamos na época dos trotes em calouros de universidade, um ritual coletivo tão brasileirinho quanto o Carnaval e a carnavalização da Justiça nas CPIs.

O trote é medieval como a universidade e quase deixou de existir em lugar civilizado. No Brasil, é um meio de reafirmar, na passagem para a vida adulta, que o jovem estudante pertence mesmo a uma sociedade 5autoritária, violenta e de privilégio.

Submissão e humilhação são a essência do rito, mas expressivas mesmo são suas formas: o calouro é muita vez obrigado a assumir o papel de pobre brasileiro. A humilhação também faz parte da iniciação universitária americana, embora nesse caso o rito marque a entrada na irmandade, sinal de exclusivismo e vivência de segredos de uma elite que se ressente da falta de aristocracia e de mistérios em sua sociedade ideologicamente 10igualitária e laica.

De início, como em muito ritual, o jovem é descaracterizado e marcado fisicamente. É sujo de tinta, de lama, até de porcarias excrementícias; raspam sua cabeça. Ao mesmo tempo que apaga simbolicamente sua identidade, a pichação do calouro lhe confere a marca do privilegiado universitário (são poucos e têm cadeia especial!). Pais e estudantes se orgulham da marca suja e da violência.

15Na mímica da humilhação dos servos, o jovem é colocado em fila, amarrado ou de mãos dadas, e conduzido pelas ruas, como se fazia com escravos, como a polícia faz com favelados. É jogado em fontes imundas, como garotos de rua. Deve esmolar para seu veterano-cafetão. Na aula-trote, o veterano vinga-se do professor autoritário ao encenar sua raiva e descarregá-la no calouro, com o que a estupidez se reproduz.

Como universidade até outro dia era privilégio oligárquico, o trote nasceu na oligarquia, imitada pelos 20arrivistas. Da oligarquia veio ainda o ritual universitário do assalto a restaurantes (‘pindura’), rito de iniciação pelo qual certa elite indica que se exclui da ordem legal dos comuns.

De vez em quando, ferem, aleijam ou matam um garoto na cretinice do trote. Ninguém é punido. Os oligarcas velhos relevam: ‘acidente’.

Não, não: é tudo de propósito.

(Vinicius Torres Freire. In: Folha de S. Paulo, 13/02/2006.)

Arrivista. Pessoa inescrupulosa, que quer vencer na vida a todo custo. (Dicionário Aurélio Eletrônico. Versão 2.0.)

 

TEXTO 2

Vagabundagem universitária começa no trote

1Todo começo de ano é a mesma cena: calouros de universidades, as cabeças raspadas e as caras pintadas, incitados ou obrigados por veteranos, ocupam os sinais de trânsito pedindo dinheiro aos motoristas. É uma das formas do chamado ‘trote’, o mais artificial dos ritos de iniciação da mais artificial das instituições contemporâneas – a universidade.

5O trote nada mais é do que o retrato da alienação em que vivem esses adolescentes das classes favorecidas. Com tempo de sobra, eles não têm em que empregar tanta liberdade.

Ou querem dizer que essas simples caras pintadas têm qualquer simbologia semelhante à das máscaras de dança das tribos primitivas estudadas por Lévi-Strauss?

Para aquelas tribos índias, as máscaras eram o atestado da onipresença do sobrenatural e da pujança dos 10mitos. Mas esses adolescentes urbanos não têm tanta complexidade. Movido a MTV e shopping centers, o espírito deles vive nas trevas. A ausência de conhecimento e saber limita-lhes os desejos e as atitudes.

Em tempos mais admiráveis, ou em sociedades mais ideais, essa massa de vagabundos estaria ajudando a cortar cana nos campos, envolvidos com a reforma agrária, em programas de assistência social nas favelas ou com crianças de rua, ou mesmo explorando os sertões e florestas do país, como faziam os estudantes do extinto 15projeto Rondon.

Hoje, mais do que nunca, há uma tendência – característica da mentalidade das elites da economia capitalista – de adulação da adolescência, de excessivo prolongamento da mesma e da excessiva indulgência para com esse período tido como ‘de intensos processos conflituosos e persistentes esforços de auto-afirmação’.

Desde adolescente, sempre olhei com desprezo esse tratamento que se pretende dar à adolescência (ou 20pelo menos a certa camada social adolescente): um cuidado especial, semelhante ao que se dá às mulheres grávidas. Pois é exatamente esse pisar em ovos da sociedade que acaba por transformar a adolescência num grande vazio, numa gravidez do nada, numa angustiante fase de absorção dos valores sociais e de integração social.

Se os adolescentes se ocupassem mais, sofreriam menos – ou pelo menos amadureceriam de verdade, 25solidários, ocupados com o sofrimento real dos outros.

Mas não, ficam vagabundando pelos semáforos das cidades, catando moedas para festas e outras leviandades. E o que é pior, sentindo-se deuses por terem conseguido decorar um punhado de fórmulas e datas e resumos de livros que os fizeram passar no teste para entrar na universidade.

A mim – que trabalhava e estudava ao mesmo tempo desde os 15 anos – causava alarme o espírito de 30vagabundagem que, cultuado na adolescência, vi prolongar-se na realidade alienada de uma universidade pública.

Na Universidade de São Paulo, onde estudei, os filhos dos ricos ainda passam anos na hibernação adolescente sustentada pelo dinheiro público.

(Marilene Felinto. In: Folha de S. Paulo, 25/02/1997.)

O conteúdo contido entre parênteses no Texto 1, linha 20, e no Texto 2, linhas 19 e 20, funciona, respectivamente, como:

A

explicação; retificação.

B

complementação; ironia.

C

notificação; retificação.

D

ironia; explicação.

E

complementação; notificação.