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(ITA - 2018 - 1 FASE)Texto 1Achei que estava bem n

(ITA - 2018 - 1ª FASE)

Texto 1

Achei que estava bem na foto. Magro, olhar vivo, rindo com os amigos na praia. Quase não havia cabelos brancos entre os poucos que sobreviviam. Comparada ao homem de hoje, era a fotografia de um jovem. Tinha 50 anos naquela época, entretanto, idade em que me considerava bem distante da juventude. Se me for dado o privilégio de chegar aos 90 em pleno domínio da razão, é possível que uma imagem de agora me cause impressão semelhante. 

O envelhecimento é sombra que nos acompanha desde a concepção: o feto de seis meses é muito mais velho do que o embrião de cinco dias. Lidar com a inexorabilidade desse processo exige uma habilidade na qual nós somos inigualáveis: a adaptação. Não há animal capaz de criar soluções diante da adversidade como nós, de sobreviver em nichos ecológicos que vão do calor tropical às geleiras do Ártico. 

Da mesma forma que ensaiamos os primeiros passos por imitação, temos que aprender a ser adolescentes, adultos e a ficar cada vez mais velhos. A adolescência é um fenômeno moderno. Nossos ancestrais passavam da infância à vida adulta sem estágios intermediários. Nas comunidades agrárias o menino de sete anos trabalhava na roça e as meninas cuidavam dos afazeres domésticos antes de chegar a essa idade. 

A figura do adolescente que mora com os pais até os 30 anos, sem abrir mão do direito de reclamar da comida à mesa e da camisa mal passada, surgiu nas sociedades industrializadas depois da Segunda Guerra Mundial. Bem mais cedo, nossos avós tinham filhos para criar.

A exaltação da juventude como o período áureo da existência humana é um mito das sociedades ocidentais. Confinar aos jovens a publicidade dos bens de consumo, exaltar a estética, os costumes e os padrões de comportamento característicos dessa faixa etária tem o efeito perverso de insinuar que o declínio começa assim que essa fase se aproxima do fim. 

A ideia de envelhecer aflige mulheres e homens modernos, muito mais do que afligia nossos antepassados. Sócrates tomou cicuta aos 70 anos, Cícero foi assassinado aos 63, Matusalém sabe-se lá quantos anos teve, mas seus contemporâneos gregos, romanos ou judeus viviam em média 30 anos. No início do século 20, a expectativa de vida ao nascer nos países da Europa mais desenvolvida não passava dos 40 anos.

A mortalidade infantil era altíssima; epidemias de peste negra, varíola, malária, febre amarela, gripe e tuberculose dizimavam populações inteiras. Nossos ancestrais viveram num mundo devastado por guerras, enfermidades infecciosas, escravidão, dores sem analgesia e a onipresença da mais temível das criaturas. Que sentido haveria em pensar na velhice quando a probabilidade de morrer jovem era tão alta? Seria como hoje preocupar-nos com a vida aos cem anos de idade, que pouquíssimos conhecerão. 

Os que estão vivos agora têm boa chance de passar dos 80. Se assim for, é preciso sabedoria para aceitar que nossos atributos se modificam com o passar dos anos. Que nenhuma cirurgia devolverá aos 60 o rosto que tínhamos aos 18, mas que envelhecer não é sinônimo de decadência física para aqueles que se movimentam, não fumam, comem com parcimônia, exercitam a cognição e continuam atentos às transformações do mundo. 

Considerar a vida um vale de lágrimas no qual submergimos de corpo e alma ao deixar a juventude é torná-la experiência medíocre. Julgar, aos 80 anos, que os melhores foram aqueles dos 15 aos 25 é não levar em conta que a memória é editora autoritária, capaz de suprimir por conta própria as experiências traumáticas e relegar ao esquecimento inseguranças, medos, desilusões afetivas, riscos desnecessários e as burradas que fizemos nessa época. 

Nada mais ofensivo para o velho do que dizer que ele tem “cabeça de jovem”. É considerá-lo mais inadequado do que o rapaz de 20 anos que se comporta como criança de dez. Ainda que maldigamos o envelhecimento, é ele que nos traz a aceitação das ambiguidades, das diferenças, do contraditório e abre espaço para uma diversidade de experiências com as quais nem sonhávamos anteriormente.

VARELLA, D. A arte de envelhecer. Adaptado. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/2016/01/1732457> Acesso em: mai. 2017.

 

Texto 2

a coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer 
a barba vai descendo e os cabelos vão caindo pra cabeça aparecer 
os filhos vão crescendo e o tempo vai dizendo que agora é pra valer 
os outros vão morrendo e a gente aprendendo a esquecer 
não quero morrer pois quero ver 
como será que deve ser envelhecer 
eu quero é viver pra ver qual é 
e dizer venha pra o que vai acontecer 
eu quero que o tapete voe / no meio da sala de estar 
eu quero que a panela de pressão pressione 
e que a pia comece a pingar 
eu quero que a sirene soe 
e me faça levantar do sofá 
eu quero pôr Rita Pavone* 
no ringtone do meu celular 
eu quero estar no meio do ciclone 
pra poder aproveitar 
e quando eu esquecer meu próprio nome 
que me chamem de velho gagá 
pois ser eternamente adolescente nada é mais demodé 
com uns ralos fios de cabelo sobre a testa que não para de crescer 
não sei por que essa gente vira a cara pro presente e esquece de aprender 
que felizmente ou infelizmente sempre o tempo vai correr.

(ANTUNES, A. Envelhecer. Álbum Ao vivo lá em casa. 2010.)

*cantora italiana de grande sucesso na década de 1960.

O ponto convergente entre os textos 1 e 2 é

A

o reconhecimento de aspectos positivos da velhice.   

B

a condenação da discriminação social com relação ao idoso.   

C

a comparação entre os diferentes estilos de vida dos idosos.   

D

a superação das experiências traumáticas vividas.   

E

o descompasso entre comportamento e idade biológica das pessoas.