(UFPR - 2015 - 2ª FASE)
Considere a seguinte manchete e texto na sequência:
Em fevereiro de 1997, a opinião pública tomou conhecimento de que um grupo de pesquisadores do Roslin Institute, de Edimburgo, havia conseguido fazer pela primeira vez o clone de um mamífero adulto. (Jornal Estado de São Paulo, segunda-feira, 24 de fevereiro de 1997)
Em seu discurso, Habermas observa que a engenharia genética foi objeto de discussões envolvendo “fé e saber”.
Ainda há pouco, os espíritos se dividiam a respeito de outro tema: se e em que medida deveríamos submeter-nos a uma autoinstrumentalização ou mesmo perseguir a meta de uma auto-otimização por meio da engenharia genética. Durante os primeiros passos nesse caminho, deflagrou-se uma luta de valores últimos entre os defensores da ciência e as Igrejas. Um dos lados temia o obscurantismo e uma exaltação de sentimentos arcaicos que alimentassem o ceticismo em relação à ciência, ao passo que o outro lado se voltava contra a crença no progresso científico, própria de um naturalismo cru que pretendia enterrar a moral. Na controvérsia sobre como lidar com os embriões humanos, por exemplo, muitas vozes se remetem a Moisés I, 27: “Deus criou o homem à sua imagem, à imagem de Deus ele o criou”. Não é preciso acreditar que Deus, que é amor, atribui a Adão e Eva um ser livre semelhante ao seu, para compreender o que significa algo ser criado à imagem de algo. O amor não pode existir sem o reconhecer-se em um outro, a liberdade não pode existir sem o reconhecimento recíproco. Essa reciprocidade na figura humana, por seu turno, tem de ser livre para poder retribuir a doação de Deus. [...] Ora, não é preciso acreditar nas premissas teológicas para entender que, se desaparecesse a diferença assumida no conceito de criação, e no lugar de Deus entrasse um sujeito qualquer, entraria em cena uma dependência de tipo inteiramente não causal. [...] O primeiro homem a determinar um outro em seu ser-assim natural, a seu bel-prazer, não destruiria aquelas mesmas liberdades que existem entre iguais para, assim, assegurar a sua diferença?
(HABERMAS, Jürgen. Fé e saber. Editora São Paulo: Unesp, 2013.)
Sabendo que a crítica que a tradição religiosa faz à tradição científica envolve aspectos morais, aponte as preocupações e as consequências, segundo Habermas, que devem dizer respeito tanto a religiosos quanto a não religiosos acerca da manipulação genética de seres humanos.