(UFPR - 2015 - 2ª FASE)
Reconhecemos [...] uma uniformidade nas ações e motivações humanas de forma tão pronta e universal como o fazemos no caso da operação dos corpos (p. 379). Parece [...] não apenas que a conjunção entre motivos e ações voluntárias é tão regular e uniforme como a que existe entre a causa e o efeito de qualquer parte da natureza, mas também que essa conjunção regular tem sido universalmente reconhecida pela humanidade [...] (p. 384). [...] Quando consideramos quão adequadamente se ligam as evidências natural e moral, formando uma única cadeia de argumentos, não hesitaremos em admitir que elas são da mesma natureza e derivam dos mesmos princípios. Um prisioneiro [...] quando levado ao cadafalso, prevê com tanta certeza sua morte tanto a partir da constância e fidelidade de seus guardas quanto da operação do machado ou da roda. Sua mente percorre uma certa sequência de ideias: a recusa dos soldados em consentir na sua fuga, a ação do carrasco, a cabeça separando-se do corpo, a hemorragia, os movimentos convulsivos e a morte. Eis aqui um encadeamento de causas naturais e ações voluntárias, mas a mente não sente nenhuma diferença entre elas ao passar de um elo para outro, nem está menos certa do futuro resultado do que estaria se ele se conectasse a objetos presentes à sua memória ou sentidos por uma sequência de causas cimentadas pelo que nos apraz chamar uma necessidade física (p. 385-6). [...] Um homem que ao meio-dia deixe sua bolsa recheada de ouro na calçada de Charing Cross [uma movimentada rua de Londres] pode tão bem esperar que ela voe longe como uma pena como que a encontrará intacta uma hora mais tarde. Mais da metade dos raciocínios humanos contêm inferências de natureza semelhante, acompanhadas de maiores ou menores graus de certeza, em proporção à experiência que temos da conduta costumeira dos homens (p. 386-7). [...] Logo que nos convencemos de que tudo o que sabemos acerca de qualquer tipo de causação é simplesmente a conjunção constante de objetos e a consequente inferência de um ao outro realizada pela mente, e descobrimos que todos admitem universalmente que essas duas condições ocorrem nas ações voluntárias, reconhecemos talvez mais facilmente que essa mesma necessidade é comum a todas as causas (p. 387).
(Hume, David. “Da liberdade e necessidade. Uma investigação sobre o entendimento humano”, seção 8. In: Antologia de textos filosóficos. Secretaria de Estado da Educação do Paraná, 2009.)
Hume pretende mostrar com seus exemplos que os homens comuns de fato aceitam a doutrina da necessidade da conduta humana, contrariamente ao que afirmam certos filósofos, quando dizem que o homem é dotado de uma vontade livre. Explique como os exemplos servem para mostrar que os homens entendem que a conduta humana é necessária e que a vontade não é livre.