(UNICAMP - 2018 - 1ª fase)
Transforma-se o amador na coisa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho, logo, mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.
Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
Pois com ele tal alma está liada.
Mas esta linda e pura semideia,
Que, como o acidente em seu sujeito,
Assim como a alma minha se conforma,
Está no pensamento como ideia;
E o vivo e puro amor de que sou feito,
Como a matéria simples busca a forma.
(Luís de Camões, Lírica: redondilhas e sonetos, Rio de Janeiro: Ediouro / São Paulo: Publifolha, 1997, p. 85.)
Um dos aspectos mais importantes da lírica de Camões é a retomada renascentista de ideias do filósofo grego Platão.
Considerando o soneto citado, pode-se dizer que o chamado “neoplatonismo” camoniano
é afirmado nos dois primeiros quartetos, uma vez que a união entre amador e pessoa amada resulta em uma alma única e perfeita.
é confirmado nos dois últimos tercetos, uma vez que a beleza e a pureza reúnem-se finalmente na matéria simples que deseja.
é negado nos dois primeiros quartetos, uma vez que a consequência da união entre amador e coisa amada é a ausência de desejo.
é contrariado nos dois últimos tercetos, uma vez que a pureza e a beleza mantêm-se em harmonia na sua condição de ideia.