(UNESP - 2013/2 - 1a fase)
Instrução: As questões de números 01 a 05 tomam por base uma passagem da crônica O pai, hoje e amanhã, de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987).
A civilização industrial, entidade abstrata, nem por isso menos poderosa, encomendou à ciência aplicada a execução de um projeto extremamente concreto: a fabricação do ser humano sem pais.
A ciência aplicada faz o possível para aviar a encomenda a médio prazo. Já venceu a primeira etapa, com a inseminação artificial, que, de um lado, acelera a produtividade dos rebanhos (resultado econômico) e, de outro, anestesia o sentimento filial (resultado moral).
O ser humano concebido por esse processo tanto pode considerar-se filho de dois pais como de nenhum. Em fase mais evoluída, o chamado bebê de proveta dispensará a incubação em ventre materno, desenvolvendo-se sob condições artificiais plenamente satisfatórias. Nenhum vínculo de memória, gratidão, amor, interesse, costume – direi mesmo: de ressentimento ou ódio – o ligará a qualquer pessoa responsável por seu aparecimento. O sêmen, anônimo, obtido por masturbação profissional e recolhido ao banco especializado, por sua vez cederá lugar ao gerador sintético, extraído de recursos da natureza vegetal e mineral. Estará abolida, assim, qualquer participação consciente do homem e da mulher no preparo e formação de uma unidade humana. Esta será produzida sob critérios políticos e econômicos tecnicamente estabelecidos, que excluem a inútil e mesmo perturbadora intromissão do casal. Pai? Mito do passado.
Aparentemente, tal projeto parece coincidir com a tendência, acentuada nos últimos anos, de se contestar a figura tradicional do pai. Eliminando-se a presença incômoda, ter-se-ia realizado o ideal de inúmeros jovens que se revoltam contra ela – o pai de família e o pai social, o governo, a lei – e aspiram à vida isenta de compromissos com valores do passado.
Julgo ilusória esta interpretação. O projeto tecnológico de eliminação do pai vai longe demais no caminho da quebra de padrões. A meu ver, a insubmissão dos filhos aos pais é fenômeno que envolve novo conceito de relações, e não ruptura de relações.
(De notícias e não notícias faz-se a crônica, 1975.)
Com o termo unidade humana, empregado no penúltimo período do terceiro parágrafo, Drummond sugere que
cada ser humano será como um produto industrial qualquer.
cada indivíduo já nascerá como um democrata por natureza
não haverá diferença de sexo entre as pessoas
os homens se tornarão solidários e dotados de livre arbítrio
a população mundial agirá como se fosse um só ser