(UEL 2018 - 2a fase) Leia os poemas a seguir, de Carlos Drummond de Andrade, e responda às questões de 1 a 7.
Sentimental
Ponho-me a escrever teu nome
com letras de macarrão.
No prato, a sopa esfria, cheia de escamas
e debruçados na mesa todos contemplam
esse romântico trabalho.
Desgraçadamente falta uma letra,
uma letra somente
para acabar teu nome!
– Está sonhando? Olhe que a sopa esfria!
Eu estava sonhando...
E há em todas as consciências um cartaz amarelo:
“Neste país é proibido sonhar”.
Poema do jornal
O fato ainda não acabou de acontecer
e já a mão nervosa do repórter
o transforma em notícia.
O marido está matando a mulher.
A mulher ensanguentada grita.
Ladrões arrombam o cofre.
A polícia dissolve o meeting.
A pena escreve.
Vem da sala de linotipos a doce música mecânica.
Poesia
Gastei uma hora pensando um verso
que a pena não quer escrever.
No entanto ele está cá dentro
inquieto, vivo.
Ele está cá dentro
e não quer sair.
Mas a poesia deste momento
inunda minha vida inteira.
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Alguma poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. p. 35; 41; 45).
O termo “pena”, utilizado no segundo verso de “Poesia”, tem o significado de peça que se adapta à caneta, ou é a própria caneta, ou ainda corresponde ao instrumento com que se escreve. A palavra, porém, tem outros sentidos dicionarizados. Assinale a alternativa em que se estabelece a correta correlação entre a palavra empregada no poema e os demais sentidos.
O sentido de “sanção aplicada como punição ou como reparação por uma ação julgada repreensível” é válido, pois o sujeito lírico lastima ter gasto muito tempo com a elaboração de um verso.
O significado de “sofrimento; aflição” é inviável, pois a euforia com o êxito da concretização do poema está desvinculada de um estado de espírito perturbado do sujeito lírico.
O uso do termo com o sentido de “tristeza, amargura, pesar” cabe, pois este estado de espírito se sobrepõe à expressão da satisfação fugaz que acomete o sujeito lírico.
O sentido de “castigo, condenação, penitência” deve ser descartado, pois é superado pela carga de emoção confessada pelo sujeito lírico em seu processo de reflexão sobre a composição poética.
O significado de “compaixão, piedade, comiseração” é cabível, pois o apego à ironia é preterido pela adesão ao sentimentalismo, como estratégia do sujeito lírico para se afastar das práticas românticas.