(IME - 2019/2020 - 2 FASE) A primeira publicao do conto O Alienista, de Machado de Assis, ocorreu como folhetim na revista carioca A Estao, entre os anos de 1881 e 1882. Nessa mesma poca, uma grande reforma educacional efetuou-se no Brasil, criando, dentre outras, a cadeira de Clnica Psiquitrica. nesse contexto de uma psiquiatria ainda embrionria que Machado prope sua crtica cida, reveladora da escassez de conhecimento cientfico e da abundncia de vaidades, concomitantemente. A obra deixa ver as relaes promscuas entre o poder mdico que se pretendia baluarte da cincia e o poder poltico tal como era exercido em Itagua, ento uma vila, distante apenas alguns quilmetros da capital Rio de Janeiro. O conto se desenvolve em treze breves captulos, ao longo dos quais o alienista vai fazendo suas experimentaes cientificistas at que ele mesmo conclua pela necessidade de seu isolamento, visto que reconhece em si mesmo a nica pessoa cujas faculdades mentais encontram-se equilibradas, sendo ele, portanto, aquele que destoa dos demais, devendo, por isso, alienar-se. Texto 1 Captulo IV UMA TEORIA NOVA 1 Ao passo que D. Evarista, em lgrimas, vinha buscando o Rio de Janeiro, Simo Bacamarte estudava por todos os lados uma certa ideia arrojada e nova, prpria a alargar as bases da psicologia. Todo o tempo que lhe sobrava dos cuidados da Casa Verde era pouco para andar na rua, ou de casa em casa, conversando as gentes, sobre trinta mil assuntos, e virgulando as falas de um olhar que metia medo aos mais heroicos. 5 Um dia de manh, eram passadas trs semanas, estando Crispim Soares ocupado em temperar um medicamento, vieram dizer-lhe que o alienista o mandava chamar. Tratava-se de negcio importante, segundo ele me disse, acrescentou o portador. 10 Crispim empalideceu. Que negcio importante podia ser, se no alguma notcia da comitiva, e especialmente da mulher? Porque este tpico deve ficar claramente definido, visto insistirem nele os cronistas; Crispim amava a mulher, e, desde trinta anos, nunca estiveram separados um s dia. Assim se explicam os monlogos que fazia agora, e que os fmulos lhe ouviam muita vez: Anda, bem feito, quem te mandou consentir na viagem de Cesria? Bajulador, torpe bajulador! S para adular ao Dr Bacamarte. Pois agora aguenta-te; anda; 15aguenta-te, alma de lacaio, fracalho, vil, miservel. Dizes amm a tudo, no ? A tens o lucro, biltre!. E muitos outros nomes feios, que um homem no deve dizer aos outros, quanto mais a si mesmo. Daqui a imaginar o efeito do recado um nada. To depressa ele orecebeu como abriu mo das drogas e voou Casa Verde. 20 Simo Bacamarte recebeu-o com a alegria prpria de um sbio, uma alegria abotoada de circunspeo at o pescoo. Estou muito contente, disse ele. Notcias do nosso povo?, perguntou o boticrio com a voz trmula. O alienista fez um gesto magnfico, e respondeu: Trata-se de coisa mais alta, trata-se de uma experincia cientfica. Digo experincia, 25 porque no me atrevo a assegurar desde j a minha ideia; nem a cincia outra coisa, Sr. Soares, seno uma investigao constante. Trata-se, pois, de uma experincia, mas uma experincia que vai mudar a face da terra. A loucura, objeto dos meus estudos, era at agora uma ilha perdida no oceano da razo; comeo a suspeitar que um continente. 30 Disse isto, e calou-se, para ruminar o pasmo do boticrio. Depois explicou compridamente a sua ideia. No conceito dele a insnia abrangia uma vasta superfcie de crebros; e desenvolveu isto com grande cpia de raciocnios, de textos, de exemplos. Os exemplos achou-os na histria e em Itagua mas, como um raro esprito que era, reconheceu o perigo de citar todos os casos de Itagua e refugiou-se na histria. Assim, apontou com especialidade alguns clebres, Scrates, que tinha um demnio familiar, Pascal, que via um 35abismo esquerda, Maom, Caracala, Domiciano, Calgula etc., uma enfiada de casos e pessoas, em que de mistura vinham entidades odiosas, e entidades ridculas. E porque o boticrio se admirasse de uma tal promiscuidade, o alienista disse-lhe que era tudo a mesma coisa, e at acrescentou sentenciosamente: A ferocidade, Sr. Soares, o grotesco a srio 40 Gracioso, muito gracioso!, exclamou Crispim Soares levantando as mos ao cu. Quanto ideia de ampliar o territrio da loucura, achou-a o boticrio extravagante; mas a modstia, principal adorno de seu esprito, no lhe sofreu confessar outra coisa alm de um nobre entusiasmo; declarou-a sublime e verdadeira, e acrescentou que era caso de matraca. Esta expresso no tem equivalente no estilo moderno. Naquele tempo, Itagua, que como as 45 demais vilas, arraiais e povoaes da colnia, no dispunha de imprensa, tinha dois modos de divulgar uma notcia: ou por meio de cartazes manuscritos e pregados na porta da Cmara, e da matriz; ou por meio de matraca. Eis em que consistia este segundo uso. Contratava-se um homem, por um ou mais dias, para andar as ruas do povoado, com uma matraca na mo. 50 De quando em quando tocava a matraca, reunia-se gente, e ele anunciava o que lhe incumbiam, um remdio para sezes, umas terras lavradias, um soneto, um donativo eclesistico, a melhor tesoura da vila, o mais belo discurso do ano etc. O sistema tinha inconvenientes para a paz pblica; mas era conservado pela grande energia de divulgao que possua. Por exemplo, um dos vereadores, aquele justamente que mais se opusera 55 criao da Casa Verde, desfrutava a reputao de perfeito educador de cobras e macacos, e alis nunca domesticara um s desses bichos; mas, tinha o cuidado de fazer trabalhar a matraca todos os meses. E dizem as crnicas que algumas pessoas afirmavam ter visto cascavis danando no peito do vereador; afirmao perfeitamente falsa, mas s devida absoluta confiana no sistema. Verdade, verdade, nem todas as instituies do antigo regime 60 mereciam o desprezo do nosso sculo. H melhor do que anunciar a minha ideia, pratic-la, respondeu o alienista insinuao do boticrio. E o boticrio, no divergindo sensivelmente deste modo de ver, disse-lhe que sim, que era melhor comear pela execuo. 65 Sempre haver tempo de a dar matraca, concluiu ele. Simo Bacamarte refletiu ainda um instante, e disse: Suponho o esprito humano uma vasta concha, o meu fim, Sr. Soares, ver se posso extrair a prola, que a razo; por outros termos, demarquemos definitivamente os limites da razo e da loucura. A razo o perfeito equilbrio de todas as faculdades; fora da insnia, 70insnia e s insnia. O Vigrio Lopes, a quem ele confiou a nova teoria, declarou lisamente que no chegava a entend-la, que era uma obra absurda, e, se no era absurda, era de tal modo colossal que no merecia princpio de execuo. Com a definio atual, que a de todos os tempos, acrescentou, a loucura e a razo 75esto perfeitamente delimitadas. Sabe-se onde uma acaba e onde a outra comea. Para que transpor a cerca? Sobre o lbio fino e discreto do alienista roou a vaga sombra de uma inteno de riso, em que o desdm vinha casado comiserao; mas nenhuma palavra saiu de suas egrgias entranhas. 80 A cincia contentou-se em estender a mo teologia, com tal segurana, que a teologia no soube enfim se devia crer em si ou na outra. Itagua e o universo beira de uma revoluo. ASSIS, Machado de.O Alienista. Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro / USP. Disponvel em: . Acesso em: 12/08/2019. Atente para as afirmaes referentes ao Texto 1: I. Assim se explicam os monlogos que ele fazia agora (linha 13). O vocbulo em destaque pode ser corretamente substitudo pelo pronome relativo cujo. II. declarou-a sublime e verdadeira, e acrescentou que era caso de matraca (linha 43). Em destaque, ocorre o emprego de um pronome oblquo e de uma conjuno integrante, que funcionam como elementos coesivos. III. [...] e ele anunciava o que lhe incumbiam, um remdio para sezes, umas terras lavradias, [...] (linhas 50 e 51). O pronome substantivo em destaque exerce a funo de pronome demonstrativo. Em relao s afirmaes, est(o) correta(s):
(IME - 2019/2020 - 2 FASE) Todo o tempo que lhe sobrava dos cuidados da Casa Verde era pouco para andar na rua, ou de casa em casa, conversando as gentes, sobre trinta mil assuntos, e virgulando as falas de um olhar que metia medo aos mais heroicos. (Texto 1, linhas 3 a 5). Assinale a opo em que o vocbulo em negrito nos fragmentos a seguir exerce a mesma funo sinttica das palavras destacadas no trecho acima:
(IME - 2019/2020 - 2 FASE) A primeira publicao do conto O Alienista, de Machado de Assis, ocorreu como folhetim na revista carioca A Estao, entre os anos de 1881 e 1882. Nessa mesma poca, uma grande reforma educacional efetuou-se no Brasil, criando, dentre outras, a cadeira de Clnica Psiquitrica. nesse contexto de uma psiquiatria ainda embrionria que Machado prope sua crtica cida, reveladora da escassez de conhecimento cientfico e da abundncia de vaidades, concomitantemente. A obra deixa ver as relaes promscuas entre o poder mdico que se pretendia baluarte da cincia e o poder poltico tal como era exercido em Itagua, ento uma vila, distante apenas alguns quilmetros da capital Rio de Janeiro. O conto se desenvolve em treze breves captulos, ao longo dos quais o alienista vai fazendo suas experimentaes cientificistas at que ele mesmo conclua pela necessidade de seu isolamento, visto que reconhece em si mesmo a nica pessoa cujas faculdades mentais encontram-se equilibradas, sendo ele, portanto, aquele que destoa dos demais, devendo, por isso, alienar-se. Texto 1 Captulo IV UMA TEORIA NOVA 1 Ao passo que D. Evarista, em lgrimas, vinha buscando o Rio de Janeiro, Simo Bacamarte estudava por todos os lados uma certa ideia arrojada e nova, prpria a alargar as bases da psicologia. Todo o tempo que lhe sobrava dos cuidados da Casa Verde era pouco para andar na rua, ou de casa em casa, conversando as gentes, sobre trinta mil assuntos, e virgulando as falas de um olhar que metia medo aos mais heroicos. 5 Um dia de manh, eram passadas trs semanas, estando Crispim Soares ocupado em temperar um medicamento, vieram dizer-lhe que o alienista o mandava chamar. Tratava-se de negcio importante, segundo ele me disse, acrescentou o portador. 10 Crispim empalideceu. Que negcio importante podia ser, se no alguma notcia da comitiva, e especialmente da mulher? Porque este tpico deve ficar claramente definido, visto insistirem nele os cronistas; Crispim amava a mulher, e, desde trinta anos, nunca estiveram separados um s dia. Assim se explicam os monlogos que fazia agora, e que os fmulos lhe ouviam muita vez: Anda, bem feito, quem te mandou consentir na viagem de Cesria? Bajulador, torpe bajulador! S para adular ao Dr Bacamarte. Pois agora aguenta-te; anda; 15aguenta-te, alma de lacaio, fracalho, vil, miservel. Dizes amm a tudo, no ? A tens o lucro, biltre!. E muitos outros nomes feios, que um homem no deve dizer aos outros, quanto mais a si mesmo. Daqui a imaginar o efeito do recado um nada. To depressa ele orecebeu como abriu mo das drogas e voou Casa Verde. 20 Simo Bacamarte recebeu-o com a alegria prpria de um sbio, uma alegria abotoada de circunspeo at o pescoo. Estou muito contente, disse ele. Notcias do nosso povo?, perguntou o boticrio com a voz trmula. O alienista fez um gesto magnfico, e respondeu: Trata-se de coisa mais alta, trata-se de uma experincia cientfica. Digo experincia, 25 porque no me atrevo a assegurar desde j a minha ideia; nem a cincia outra coisa, Sr. Soares, seno uma investigao constante. Trata-se, pois, de uma experincia, mas uma experincia que vai mudar a face da terra. A loucura, objeto dos meus estudos, era at agora uma ilha perdida no oceano da razo; comeo a suspeitar que um continente. 30 Disse isto, e calou-se, para ruminar o pasmo do boticrio. Depois explicou compridamente a sua ideia. No conceito dele a insnia abrangia uma vasta superfcie de crebros; e desenvolveu isto com grande cpia de raciocnios, de textos, de exemplos. Os exemplos achou-os na histria e em Itagua mas, como um raro esprito que era, reconheceu o perigo de citar todos os casos de Itagua e refugiou-se na histria. Assim, apontou com especialidade alguns clebres, Scrates, que tinha um demnio familiar, Pascal, que via um 35abismo esquerda, Maom, Caracala, Domiciano, Calgula etc., uma enfiada de casos e pessoas, em que de mistura vinham entidades odiosas, e entidades ridculas. E porque o boticrio se admirasse de uma tal promiscuidade, o alienista disse-lhe que era tudo a mesma coisa, e at acrescentou sentenciosamente: A ferocidade, Sr. Soares, o grotesco a srio 40 Gracioso, muito gracioso!, exclamou Crispim Soares levantando as mos ao cu. Quanto ideia de ampliar o territrio da loucura, achou-a o boticrio extravagante; mas a modstia, principal adorno de seu esprito, no lhe sofreu confessar outra coisa alm de um nobre entusiasmo; declarou-a sublime e verdadeira, e acrescentou que era caso de matraca. Esta expresso no tem equivalente no estilo moderno. Naquele tempo, Itagua, que como as 45 demais vilas, arraiais e povoaes da colnia, no dispunha de imprensa, tinha dois modos de divulgar uma notcia: ou por meio de cartazes manuscritos e pregados na porta da Cmara, e da matriz; ou por meio de matraca. Eis em que consistia este segundo uso. Contratava-se um homem, por um ou mais dias, para andar as ruas do povoado, com uma matraca na mo. 50 De quando em quando tocava a matraca, reunia-se gente, e ele anunciava o que lhe incumbiam, um remdio para sezes, umas terras lavradias, um soneto, um donativo eclesistico, a melhor tesoura da vila, o mais belo discurso do ano etc. O sistema tinha inconvenientes para a paz pblica; mas era conservado pela grande energia de divulgao que possua. Por exemplo, um dos vereadores, aquele justamente que mais se opusera 55 criao da Casa Verde, desfrutava a reputao de perfeito educador de cobras e macacos, e alis nunca domesticara um s desses bichos; mas, tinha o cuidado de fazer trabalhar a matraca todos os meses. E dizem as crnicas que algumas pessoas afirmavam ter visto cascavis danando no peito do vereador; afirmao perfeitamente falsa, mas s devida absoluta confiana no sistema. Verdade, verdade, nem todas as instituies do antigo regime 60 mereciam o desprezo do nosso sculo. H melhor do que anunciar a minha ideia, pratic-la, respondeu o alienista insinuao do boticrio. E o boticrio, no divergindo sensivelmente deste modo de ver, disse-lhe que sim, que era melhor comear pela execuo. 65 Sempre haver tempo de a dar matraca, concluiu ele. Simo Bacamarte refletiu ainda um instante, e disse: Suponho o esprito humano uma vasta concha, o meu fim, Sr. Soares, ver se posso extrair a prola, que a razo; por outros termos, demarquemos definitivamente os limites da razo e da loucura. A razo o perfeito equilbrio de todas as faculdades; fora da insnia, 70insnia e s insnia. O Vigrio Lopes, a quem ele confiou a nova teoria, declarou lisamente que no chegava a entend-la, que era uma obra absurda, e, se no era absurda, era de tal modo colossal que no merecia princpio de execuo. Com a definio atual, que a de todos os tempos, acrescentou, a loucura e a razo 75esto perfeitamente delimitadas. Sabe-se onde uma acaba e onde a outra comea. Para que transpor a cerca? Sobre o lbio fino e discreto do alienista roou a vaga sombra de uma inteno de riso, em que o desdm vinha casado comiserao; mas nenhuma palavra saiu de suas egrgias entranhas. 80 A cincia contentou-se em estender a mo teologia, com tal segurana, que a teologia no soube enfim se devia crer em si ou na outra. Itagua e o universo beira de uma revoluo. ASSIS, Machado de.O Alienista. Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro / USP. Disponvel em: . Acesso em: 12/08/2019. Os exemplos achou-os na histria e em Itagua mas, como um raro esprito que era, reconheceu o perigo de citar todos os casos de Itagua e refugiou-se na histria. Assim, apontou com especialidade alguns clebres, Scrates, que tinha um demnio familiar, Pascal, que via um abismo esquerda, Maom, Caracala, Domiciano, Calgula etc., uma enfiada de casos e pessoas, em que de mistura vinham entidades odiosas, e entidades ridculas. (Texto 1, linhas 31 a 36) O adjetivo raro, destacado no texto acima,
(IME - 2019/2020 - 2 FASE) A primeira publicao do conto O Alienista, de Machado de Assis, ocorreu como folhetim na revista carioca A Estao, entre os anos de 1881 e 1882. Nessa mesma poca, uma grande reforma educacional efetuou-se no Brasil, criando, dentre outras, a cadeira de Clnica Psiquitrica. nesse contexto de uma psiquiatria ainda embrionria que Machado prope sua crtica cida, reveladora da escassez de conhecimento cientfico e da abundncia de vaidades, concomitantemente. A obra deixa ver as relaes promscuas entre o poder mdico que se pretendia baluarte da cincia e o poder poltico tal como era exercido em Itagua, ento uma vila, distante apenas alguns quilmetros da capital Rio de Janeiro. O conto se desenvolve em treze breves captulos, ao longo dos quais o alienista vai fazendo suas experimentaes cientificistas at que ele mesmo conclua pela necessidade de seu isolamento, visto que reconhece em si mesmo a nica pessoa cujas faculdades mentais encontram-se equilibradas, sendo ele, portanto, aquele que destoa dos demais, devendo, por isso, alienar-se. Texto 1 Captulo IV UMA TEORIA NOVA 1 Ao passo que D. Evarista, em lgrimas, vinha buscando o Rio de Janeiro, Simo Bacamarte estudava por todos os lados uma certa ideia arrojada e nova, prpria a alargar as bases da psicologia. Todo o tempo que lhe sobrava dos cuidados da Casa Verde era pouco para andar na rua, ou de casa em casa, conversando as gentes, sobre trinta mil assuntos, e virgulando as falas de um olhar que metia medo aos mais heroicos. 5 Um dia de manh, eram passadas trs semanas, estando Crispim Soares ocupado em temperar um medicamento, vieram dizer-lhe que o alienista o mandava chamar. Tratava-se de negcio importante, segundo ele me disse, acrescentou o portador. 10 Crispim empalideceu. Que negcio importante podia ser, se no alguma notcia da comitiva, e especialmente da mulher? Porque este tpico deve ficar claramente definido, visto insistirem nele os cronistas; Crispim amava a mulher, e, desde trinta anos, nunca estiveram separados um s dia. Assim se explicam os monlogos que fazia agora, e que os fmulos lhe ouviam muita vez: Anda, bem feito, quem te mandou consentir na viagem de Cesria? Bajulador, torpe bajulador! S para adular ao Dr Bacamarte. Pois agora aguenta-te; anda; 15aguenta-te, alma de lacaio, fracalho, vil, miservel. Dizes amm a tudo, no ? A tens o lucro, biltre!. E muitos outros nomes feios, que um homem no deve dizer aos outros, quanto mais a si mesmo. Daqui a imaginar o efeito do recado um nada. To depressa ele orecebeu como abriu mo das drogas e voou Casa Verde. 20 Simo Bacamarte recebeu-o com a alegria prpria de um sbio, uma alegria abotoada de circunspeo at o pescoo. Estou muito contente, disse ele. Notcias do nosso povo?, perguntou o boticrio com a voz trmula. O alienista fez um gesto magnfico, e respondeu: Trata-se de coisa mais alta, trata-se de uma experincia cientfica. Digo experincia, 25 porque no me atrevo a assegurar desde j a minha ideia; nem a cincia outra coisa, Sr. Soares, seno uma investigao constante. Trata-se, pois, de uma experincia, mas uma experincia que vai mudar a face da terra. A loucura, objeto dos meus estudos, era at agora uma ilha perdida no oceano da razo; comeo a suspeitar que um continente. 30 Disse isto, e calou-se, para ruminar o pasmo do boticrio. Depois explicou compridamente a sua ideia. No conceito dele a insnia abrangia uma vasta superfcie de crebros; e desenvolveu isto com grande cpia de raciocnios, de textos, de exemplos. Os exemplos achou-os na histria e em Itagua mas, como um raro esprito que era, reconheceu o perigo de citar todos os casos de Itagua e refugiou-se na histria. Assim, apontou com especialidade alguns clebres, Scrates, que tinha um demnio familiar, Pascal, que via um 35abismo esquerda, Maom, Caracala, Domiciano, Calgula etc., uma enfiada de casos e pessoas, em que de mistura vinham entidades odiosas, e entidades ridculas. E porque o boticrio se admirasse de uma tal promiscuidade, o alienista disse-lhe que era tudo a mesma coisa, e at acrescentou sentenciosamente: A ferocidade, Sr. Soares, o grotesco a srio 40 Gracioso, muito gracioso!, exclamou Crispim Soares levantando as mos ao cu. Quanto ideia de ampliar o territrio da loucura, achou-a o boticrio extravagante; mas a modstia, principal adorno de seu esprito, no lhe sofreu confessar outra coisa alm de um nobre entusiasmo; declarou-a sublime e verdadeira, e acrescentou que era caso de matraca. Esta expresso no tem equivalente no estilo moderno. Naquele tempo, Itagua, que como as 45 demais vilas, arraiais e povoaes da colnia, no dispunha de imprensa, tinha dois modos de divulgar uma notcia: ou por meio de cartazes manuscritos e pregados na porta da Cmara, e da matriz; ou por meio de matraca. Eis em que consistia este segundo uso. Contratava-se um homem, por um ou mais dias, para andar as ruas do povoado, com uma matraca na mo. 50 De quando em quando tocava a matraca, reunia-se gente, e ele anunciava o que lhe incumbiam, um remdio para sezes, umas terras lavradias, um soneto, um donativo eclesistico, a melhor tesoura da vila, o mais belo discurso do ano etc. O sistema tinha inconvenientes para a paz pblica; mas era conservado pela grande energia de divulgao que possua. Por exemplo, um dos vereadores, aquele justamente que mais se opusera 55 criao da Casa Verde, desfrutava a reputao de perfeito educador de cobras e macacos, e alis nunca domesticara um s desses bichos; mas, tinha o cuidado de fazer trabalhar a matraca todos os meses. E dizem as crnicas que algumas pessoas afirmavam ter visto cascavis danando no peito do vereador; afirmao perfeitamente falsa, mas s devida absoluta confiana no sistema. Verdade, verdade, nem todas as instituies do antigo regime 60 mereciam o desprezo do nosso sculo. H melhor do que anunciar a minha ideia, pratic-la, respondeu o alienista insinuao do boticrio. E o boticrio, no divergindo sensivelmente deste modo de ver, disse-lhe que sim, que era melhor comear pela execuo. 65 Sempre haver tempo de a dar matraca, concluiu ele. Simo Bacamarte refletiu ainda um instante, e disse: Suponho o esprito humano uma vasta concha, o meu fim, Sr. Soares, ver se posso extrair a prola, que a razo; por outros termos, demarquemos definitivamente os limites da razo e da loucura. A razo o perfeito equilbrio de todas as faculdades; fora da insnia, 70insnia e s insnia. O Vigrio Lopes, a quem ele confiou a nova teoria, declarou lisamente que no chegava a entend-la, que era uma obra absurda, e, se no era absurda, era de tal modo colossal que no merecia princpio de execuo. Com a definio atual, que a de todos os tempos, acrescentou, a loucura e a razo 75esto perfeitamente delimitadas. Sabe-se onde uma acaba e onde a outra comea. Para que transpor a cerca? Sobre o lbio fino e discreto do alienista roou a vaga sombra de uma inteno de riso, em que o desdm vinha casado comiserao; mas nenhuma palavra saiu de suas egrgias entranhas. 80 A cincia contentou-se em estender a mo teologia, com tal segurana, que a teologia no soube enfim se devia crer em si ou na outra. Itagua e o universo beira de uma revoluo. ASSIS, Machado de.O Alienista. Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro / USP. Disponvel em: . Acesso em: 12/08/2019. Simo Bacamarte recebeu-o com a alegria prpria de um sbio, uma alegria abotoada de circunspeo at o pescoo. (Texto 1, linhas 19 e 20). A figura de linguagem construda no trecho em negrito a(o)
(IME - 2019/2020 - 2 FASE) A primeira publicao do conto O Alienista, de Machado de Assis, ocorreu como folhetim na revista carioca A Estao, entre os anos de 1881 e 1882. Nessa mesma poca, uma grande reforma educacional efetuou-se no Brasil, criando, dentre outras, a cadeira de Clnica Psiquitrica. nesse contexto de uma psiquiatria ainda embrionria que Machado prope sua crtica cida, reveladora da escassez de conhecimento cientfico e da abundncia de vaidades, concomitantemente. A obra deixa ver as relaes promscuas entre o poder mdico que se pretendia baluarte da cincia e o poder poltico tal como era exercido em Itagua, ento uma vila, distante apenas alguns quilmetros da capital Rio de Janeiro. O conto se desenvolve em treze breves captulos, ao longo dos quais o alienista vai fazendo suas experimentaes cientificistas at que ele mesmo conclua pela necessidade de seu isolamento, visto que reconhece em si mesmo a nica pessoa cujas faculdades mentais encontram-se equilibradas, sendo ele, portanto, aquele que destoa dos demais, devendo, por isso, alienar-se. Texto 1 Captulo IV UMA TEORIA NOVA 1 Ao passo que D. Evarista, em lgrimas, vinha buscando o Rio de Janeiro, Simo Bacamarte estudava por todos os lados uma certa ideia arrojada e nova, prpria a alargar as bases da psicologia. Todo o tempo que lhe sobrava dos cuidados da Casa Verde era pouco para andar na rua, ou de casa em casa, conversando as gentes, sobre trinta mil assuntos, e virgulando as falas de um olhar que metia medo aos mais heroicos. 5 Um dia de manh, eram passadas trs semanas, estando Crispim Soares ocupado em temperar um medicamento, vieram dizer-lhe que o alienista o mandava chamar. Tratava-se de negcio importante, segundo ele me disse, acrescentou o portador. 10 Crispim empalideceu. Que negcio importante podia ser, se no alguma notcia da comitiva, e especialmente da mulher? Porque este tpico deve ficar claramente definido, visto insistirem nele os cronistas; Crispim amava a mulher, e, desde trinta anos, nunca estiveram separados um s dia. Assim se explicam os monlogos que fazia agora, e que os fmulos lhe ouviam muita vez: Anda, bem feito, quem te mandou consentir na viagem de Cesria? Bajulador, torpe bajulador! S para adular ao Dr Bacamarte. Pois agora aguenta-te; anda; 15aguenta-te, alma de lacaio, fracalho, vil, miservel. Dizes amm a tudo, no ? A tens o lucro, biltre!. E muitos outros nomes feios, que um homem no deve dizer aos outros, quanto mais a si mesmo. Daqui a imaginar o efeito do recado um nada. To depressa ele orecebeu como abriu mo das drogas e voou Casa Verde. 20 Simo Bacamarte recebeu-o com a alegria prpria de um sbio, uma alegria abotoada de circunspeo at o pescoo. Estou muito contente, disse ele. Notcias do nosso povo?, perguntou o boticrio com a voz trmula. O alienista fez um gesto magnfico, e respondeu: Trata-se de coisa mais alta, trata-se de uma experincia cientfica. Digo experincia, 25 porque no me atrevo a assegurar desde j a minha ideia; nem a cincia outra coisa, Sr. Soares, seno uma investigao constante. Trata-se, pois, de uma experincia, mas uma experincia que vai mudar a face da terra. A loucura, objeto dos meus estudos, era at agora uma ilha perdida no oceano da razo; comeo a suspeitar que um continente. 30 Disse isto, e calou-se, para ruminar o pasmo do boticrio. Depois explicou compridamente a sua ideia. No conceito dele a insnia abrangia uma vasta superfcie de crebros; e desenvolveu isto com grande cpia de raciocnios, de textos, de exemplos. Os exemplos achou-os na histria e em Itagua mas, como um raro esprito que era, reconheceu o perigo de citar todos os casos de Itagua e refugiou-se na histria. Assim, apontou com especialidade alguns clebres, Scrates, que tinha um demnio familiar, Pascal, que via um 35abismo esquerda, Maom, Caracala, Domiciano, Calgula etc., uma enfiada de casos e pessoas, em que de mistura vinham entidades odiosas, e entidades ridculas. E porque o boticrio se admirasse de uma tal promiscuidade, o alienista disse-lhe que era tudo a mesma coisa, e at acrescentou sentenciosamente: A ferocidade, Sr. Soares, o grotesco a srio 40 Gracioso, muito gracioso!, exclamou Crispim Soares levantando as mos ao cu. Quanto ideia de ampliar o territrio da loucura, achou-a o boticrio extravagante; mas a modstia, principal adorno de seu esprito, no lhe sofreu confessar outra coisa alm de um nobre entusiasmo; declarou-a sublime e verdadeira, e acrescentou que era caso de matraca. Esta expresso no tem equivalente no estilo moderno. Naquele tempo, Itagua, que como as 45 demais vilas, arraiais e povoaes da colnia, no dispunha de imprensa, tinha dois modos de divulgar uma notcia: ou por meio de cartazes manuscritos e pregados na porta da Cmara, e da matriz; ou por meio de matraca. Eis em que consistia este segundo uso. Contratava-se um homem, por um ou mais dias, para andar as ruas do povoado, com uma matraca na mo. 50 De quando em quando tocava a matraca, reunia-se gente, e ele anunciava o que lhe incumbiam, um remdio para sezes, umas terras lavradias, um soneto, um donativo eclesistico, a melhor tesoura da vila, o mais belo discurso do ano etc. O sistema tinha inconvenientes para a paz pblica; mas era conservado pela grande energia de divulgao que possua. Por exemplo, um dos vereadores, aquele justamente que mais se opusera 55 criao da Casa Verde, desfrutava a reputao de perfeito educador de cobras e macacos, e alis nunca domesticara um s desses bichos; mas, tinha o cuidado de fazer trabalhar a matraca todos os meses. E dizem as crnicas que algumas pessoas afirmavam ter visto cascavis danando no peito do vereador; afirmao perfeitamente falsa, mas s devida absoluta confiana no sistema. Verdade, verdade, nem todas as instituies do antigo regime 60 mereciam o desprezo do nosso sculo. H melhor do que anunciar a minha ideia, pratic-la, respondeu o alienista insinuao do boticrio. E o boticrio, no divergindo sensivelmente deste modo de ver, disse-lhe que sim, que era melhor comear pela execuo. 65 Sempre haver tempo de a dar matraca, concluiu ele. Simo Bacamarte refletiu ainda um instante, e disse: Suponho o esprito humano uma vasta concha, o meu fim, Sr. Soares, ver se posso extrair a prola, que a razo; por outros termos, demarquemos definitivamente os limites da razo e da loucura. A razo o perfeito equilbrio de todas as faculdades; fora da insnia, 70insnia e s insnia. O Vigrio Lopes, a quem ele confiou a nova teoria, declarou lisamente que no chegava a entend-la, que era uma obra absurda, e, se no era absurda, era de tal modo colossal que no merecia princpio de execuo. Com a definio atual, que a de todos os tempos, acrescentou, a loucura e a razo 75esto perfeitamente delimitadas. Sabe-se onde uma acaba e onde a outra comea. Para que transpor a cerca? Sobre o lbio fino e discreto do alienista roou a vaga sombra de uma inteno de riso, em que o desdm vinha casado comiserao; mas nenhuma palavra saiu de suas egrgias entranhas. 80 A cincia contentou-se em estender a mo teologia, com tal segurana, que a teologia no soube enfim se devia crer em si ou na outra. Itagua e o universo beira de uma revoluo. ASSIS, Machado de.O Alienista. Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro / USP. Disponvel em: . Acesso em: 12/08/2019. Crispim empalideceu. Que negcio importante podia ser, se no alguma notcia da comitiva, e especialmente da mulher? Porque este tpico deve ficar claramente definido, visto insistirem nele os cronistas; (Texto 1, linhas 9 a 11). A orao visto insistirem nele os cronistas:
(IME - 2019/2020 - 2 FASE) Texto 2 XIII 1 Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muita vez desperto E abro as janelas, plido de espanto 5E conversamos toda a noite, enquanto A Via-lctea, como um plio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo cu deserto. 10Direis agora: Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando esto contigo? E eu vos direi: Amai para entend-las! Pois s quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas. BILAC, Olavo.Antologia: Poesias. Martin Claret, 2002. p. 37-55. Via-Lctea. Disponvel em: . Acesso em: 19/08/2019. A palavra pois, usada em Pois s quem ama pode ter ouvido (Texto 2, verso 13),
(IME - 2019/2020 - 2 FASE) O soneto XIII de Via-Lctea, coleo publicada em 1888 no livro Poesias, o texto mais famoso da antologia, obra de estreia do poeta Olavo Bilac. O texto, cuidadosamente ritmado, suas rimas e a escolha da forma fixa revelam rigor formal e estilstico caros ao movimento parnasiano; o tema do poema, no entanto, entra em coliso com o tema da literatura tpica do movimento, tal como concebido no continente europeu. Texto 2 XIII 1 Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muita vez desperto E abro as janelas, plido de espanto 5E conversamos toda a noite, enquanto A Via-lctea, como um plio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo cu deserto. 10Direis agora: Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando esto contigo? E eu vos direi: Amai para entend-las! Pois s quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas. BILAC, Olavo. Antologia: Poesias. Martin Claret, 2002. p. 37-55. Via-Lctea. Disponvel em: . Acesso em: 19/08/2019. Dentre as afirmaes abaixo, assinale a que falsa em relao ao Texto 2.
(IME - 2019/2020 - 2 FASE) O soneto XIII de Via-Lctea, coleo publicada em 1888 no livro Poesias, o texto mais famoso da antologia, obra de estreia do poeta Olavo Bilac. O texto, cuidadosamente ritmado, suas rimas e a escolha da forma fixa revelam rigor formal e estilstico caros ao movimento parnasiano; o tema do poema, no entanto, entra em coliso com o tema da literatura tpica do movimento, tal como concebido no continente europeu. Texto 2 XIII 1 Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muita vez desperto E abro as janelas, plido de espanto 5 E conversamos toda a noite, enquanto A Via-lctea, como um plio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo cu deserto. 10 Direis agora: Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando esto contigo? E eu vos direi: Amai para entend-las! Pois s quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas. BILAC, Olavo. Antologia: Poesias. Martin Claret, 2002. p. 37-55. Via-Lctea. Disponvel em: . Acesso em: 19/08/2019. Direis agora: Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando esto contigo? (Texto 2, versos 9 a 11) No trecho acima empregado o chamado discurso direto. Isso se confirma pelo(a)
(IME - 2019/2020 - 2 FASE) O soneto XIII de Via-Lctea, coleo publicada em 1888 no livro Poesias, o texto mais famoso da antologia, obra de estreia do poeta Olavo Bilac. O texto, cuidadosamente ritmado, suas rimas e a escolha da forma fixa revelam rigor formal e estilstico caros ao movimento parnasiano; o tema do poema, no entanto, entra em coliso com o tema da literatura tpica do movimento, tal como concebido no continente europeu. Texto 2 XIII 1 Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muita vez desperto E abro as janelas, plido de espanto 5E conversamos toda a noite, enquanto A Via-lctea, como um plio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo cu deserto. 10Direis agora: Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando esto contigo? E eu vos direi: Amai para entend-las! Pois s quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas. BILAC, Olavo.Antologia: Poesias. Martin Claret, 2002. p. 37-55. Via-Lctea. Disponvel em: . Acesso em: 19/08/2019. O vocbulo afim ao campo semntico da palavra espanto, empregada em E abro as janelas, plido de espanto (Texto 2, verso 4),
(IME - 2019/2020 - 2 FASE) Texto 2 XIII 1 Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muita vez desperto E abro as janelas, plido de espanto 5E conversamos toda a noite, enquanto A Via-lctea, como um plio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo cu deserto. 10Direis agora: Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando esto contigo? E eu vos direi: Amai para entend-las! Pois s quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas. BILAC, Olavo.Antologia: Poesias. Martin Claret, 2002. p. 37-55. Via-Lctea. Disponvel em: . Acesso em: 19/08/2019. correto afirmar que a ideia principal do Texto 2:
(IME -2018/2019 - 2 FASE ) Texto 1 BECOS DE GOIS 1 Beco da minha terra... Amo tua paisagem triste, ausente e suja. Teu ar sombrio. Tua velha umidade andrajosa. Teu lodo negro, esverdeado, escorregadio. 5 E a rstia de sol que ao meio-dia desce, fugidia, e semeia polmes dourados no teu lixo pobre, calando de ouro a sandlia velha, jogada no teu monturo. Amo a prantina silenciosa do teu fio de gua, 10 descendo de quintais escusos sem pressa, e se sumindo depressa na brecha de um velho cano. Amo a avenca delicada que renasce na frincha de teus muros empenados, 15 e a plantinha desvalida, de caule mole que se defende, viceja e floresce no agasalho de tua sombra mida e calada. Amo esses burros-de-lenha que passam pelos becos antigos. Burrinhos dos morros, 20 secos, lanzudos, malzelados, cansados, pisados. Arrochados na sua carga, sabidos, procurando a sombra, no range-range das cangalhas. E aquele menino, lenheiro ele, salvo seja. Sem infncia, sem idade. 25 Franzino, maltrapilho, pequeno para ser homem, forte para ser criana. Ser indefeso, indefinido, que s se v na minha cidade. Amo e canto com ternura 30 todo o errado da minha terra. Becos da minha terra, discriminados e humildes, lembrando passadas eras... Beco do Cisco. 35 Beco do Cotovelo. Beco do Antnio Gomes. Beco das Taquaras. Beco do Seminrio. Bequinho da Escola. 40 Beco do Ouro Fino. Beco da Cachoeira Grande. Beco da Calabrote. Beco do Mingu. Beco da Vila Rica... 45 Conto a estria dos becos, dos becos da minha terra, suspeitos... mal afamados onde famlia de conceito no passava. Lugar de gentinha - diziam, virando a cara. 50 De gente do pote dgua. De gente de p no cho. Becos de mulher perdida. Becos de mulheres da vida. Renegadas, confinadas 55 na sombra triste do beco. Quarto de porta e janela. Prostituta anemiada, solitria, htica, engalicada, tossindo, escarrando sangue 60 na umidade suja do beco. Becos mal assombrados. Becos de assombrao... Altas horas, mortas horas... Capito-mor - alma penada, 65 terror dos soldados, castigado nas armas. Capito-mor, alma penada, num cavalo ferrado, chispando fogo, descendo e subindo o beco, 70 comandando o quadrado - feixe de varas... Arrastando espada, tinindo esporas... Mulher-dama. Mulheres da vida, perdidas, comeavam em boas casas, depois, 75 baixavam pra o beco. Queriam alegria. Faziam bailaricos. Baile Sifiltico - era ele assim chamado. O delegado-chefe de Polcia - brabeza - dava em cima... 80 Mandava sem d, na peia. No dia seguinte, coitadas, cabea raspada a navalha, obrigadas a capinar o Largo do Chafariz, na frente da Cadeia. 85 Becos da minha terra... Becos de assombrao. Romnticos, pecaminosos... Tm poesia e tm drama. O drama da mulher da vida, antiga, 90 humilhada, malsinada. Meretriz venrea, desprezada, mesentrica, exangue. Cabea raspada a navalha, castigada a palmatria, 95 capinando o largo, chorando. Golfando sangue. (LTIMO ATO) Um irmo vicentino comparece. Traz uma entrada grtis do So Pedro de Alcntara. 100 Uma passagem de terceira no grande coletivo de So Vicente. Uma estao permanente de repouso - no aprazvel So Miguel. Cai o pano. CORALINA, Cora. Poemas dos Becos de Gois e Estrias Mais. 21a ed. - So Paulo: Global Editora, 2006. Sabe-se que o prefixo de negao in, na lngua portuguesa, pode assumir diferentes formas, de acordo com a ocorrncia dos fenmenos de assimilao e mesmo de dissimilao. Assinale a opo em que o significado do prefixo in difere do sentido encontrado nas palavras indefeso e indefinido no verso abaixo transcrito: Ser indefeso, indefinido, que s se v na minha cidade. (texto 1, verso 28)
(IME -2018/2019 - 2 FASE ) Texto 1 BECOS DE GOIS 1 Beco da minha terra... Amo tua paisagem triste, ausente e suja. Teu ar sombrio. Tua velha umidade andrajosa. Teu lodo negro, esverdeado, escorregadio. 5 E a rstia de sol que ao meio-dia desce, fugidia, e semeia polmes dourados no teu lixo pobre, calando de ouro a sandlia velha, jogada no teu monturo. Amo a prantina silenciosa do teu fio de gua, 10 descendo de quintais escusos sem pressa, e se sumindo depressa na brecha de um velho cano. Amo a avenca delicada que renasce na frincha de teus muros empenados, 15 e a plantinha desvalida, de caule mole que se defende, viceja e floresce no agasalho de tua sombra mida e calada. Amo esses burros-de-lenha que passam pelos becos antigos. Burrinhos dos morros, 20 secos, lanzudos, malzelados, cansados, pisados. Arrochados na sua carga, sabidos, procurando a sombra, no range-range das cangalhas. E aquele menino, lenheiro ele, salvo seja. Sem infncia, sem idade. 25 Franzino, maltrapilho, pequeno para ser homem, forte para ser criana. Ser indefeso, indefinido, que s se v na minha cidade. Amo e canto com ternura 30 todo o errado da minha terra. Becos da minha terra, discriminados e humildes, lembrando passadas eras... Beco do Cisco. 35 Beco do Cotovelo. Beco do Antnio Gomes. Beco das Taquaras. Beco do Seminrio. Bequinho da Escola. 40 Beco do Ouro Fino. Beco da Cachoeira Grande. Beco da Calabrote. Beco do Mingu. Beco da Vila Rica... 45 Conto a estria dos becos, dos becos da minha terra, suspeitos... mal afamados onde famlia de conceito no passava. Lugar de gentinha - diziam, virando a cara. 50 De gente do pote dgua. De gente de p no cho. Becos de mulher perdida. Becos de mulheres da vida. Renegadas, confinadas 55 na sombra triste do beco. Quarto de porta e janela. Prostituta anemiada, solitria, htica, engalicada, tossindo, escarrando sangue 60 na umidade suja do beco. Becos mal assombrados. Becos de assombrao... Altas horas, mortas horas... Capito-mor - alma penada, 65 terror dos soldados, castigado nas armas. Capito-mor, alma penada, num cavalo ferrado, chispando fogo, descendo e subindo o beco, 70 comandando o quadrado - feixe de varas... Arrastando espada, tinindo esporas... Mulher-dama. Mulheres da vida, perdidas, comeavam em boas casas, depois, 75 baixavam pra o beco. Queriam alegria. Faziam bailaricos. Baile Sifiltico - era ele assim chamado. O delegado-chefe de Polcia - brabeza - dava em cima... 80 Mandava sem d, na peia. No dia seguinte, coitadas, cabea raspada a navalha, obrigadas a capinar o Largo do Chafariz, na frente da Cadeia. 85 Becos da minha terra... Becos de assombrao. Romnticos, pecaminosos... Tm poesia e tm drama. O drama da mulher da vida, antiga, 90 humilhada, malsinada. Meretriz venrea, desprezada, mesentrica, exangue. Cabea raspada a navalha, castigada a palmatria, 95 capinando o largo, chorando. Golfando sangue. (LTIMO ATO) Um irmo vicentino comparece. Traz uma entrada grtis do So Pedro de Alcntara. 100 Uma passagem de terceira no grande coletivo de So Vicente. Uma estao permanente de repouso - no aprazvel So Miguel. Cai o pano. CORALINA, Cora. Poemas dos Becos de Gois e Estrias Mais. 21a ed. - So Paulo: Global Editora, 2006. Os becos descritos no texto 1 denunciam lugares marginalizados, abandonados e, mais frequentemente, no amados. Assinale a opo em que o verso transcrito condiz com essa afirmativa.
(IME -2018/2019 - 2 FASE ) Texto 1 BECOS DE GOIS 1 Beco da minha terra... Amo tua paisagem triste, ausente e suja. Teu ar sombrio. Tua velha umidade andrajosa. Teu lodo negro, esverdeado, escorregadio. 5 E a rstia de sol que ao meio-dia desce, fugidia, e semeia polmes dourados no teu lixo pobre, calando de ouro a sandlia velha, jogada no teu monturo. Amo a prantina silenciosa do teu fio de gua, 10 descendo de quintais escusos sem pressa, e se sumindo depressa na brecha de um velho cano. Amo a avenca delicada que renasce na frincha de teus muros empenados, 15 e a plantinha desvalida, de caule mole que se defende, viceja e floresce no agasalho de tua sombra mida e calada. Amo esses burros-de-lenha que passam pelos becos antigos. Burrinhos dos morros, 20 secos, lanzudos, malzelados, cansados, pisados. Arrochados na sua carga, sabidos, procurando a sombra, no range-range das cangalhas. E aquele menino, lenheiro ele, salvo seja. Sem infncia, sem idade. 25 Franzino, maltrapilho, pequeno para ser homem, forte para ser criana. Ser indefeso, indefinido, que s se v na minha cidade. Amo e canto com ternura 30 todo o errado da minha terra. Becos da minha terra, discriminados e humildes, lembrando passadas eras... Beco do Cisco. 35 Beco do Cotovelo. Beco do Antnio Gomes. Beco das Taquaras. Beco do Seminrio. Bequinho da Escola. 40 Beco do Ouro Fino. Beco da Cachoeira Grande. Beco da Calabrote. Beco do Mingu. Beco da Vila Rica... 45 Conto a estria dos becos, dos becos da minha terra, suspeitos... mal afamados onde famlia de conceito no passava. Lugar de gentinha - diziam, virando a cara. 50 De gente do pote dgua. De gente de p no cho. Becos de mulher perdida. Becos de mulheres da vida. Renegadas, confinadas 55 na sombra triste do beco. Quarto de porta e janela. Prostituta anemiada, solitria, htica, engalicada, tossindo, escarrando sangue 60 na umidade suja do beco. Becos mal assombrados. Becos de assombrao... Altas horas, mortas horas... Capito-mor - alma penada, 65 terror dos soldados, castigado nas armas. Capito-mor, alma penada, num cavalo ferrado, chispando fogo, descendo e subindo o beco, 70 comandando o quadrado - feixe de varas... Arrastando espada, tinindo esporas... Mulher-dama. Mulheres da vida, perdidas, comeavam em boas casas, depois, 75 baixavam pra o beco. Queriam alegria. Faziam bailaricos. Baile Sifiltico - era ele assim chamado. O delegado-chefe de Polcia - brabeza - dava em cima... 80 Mandava sem d, na peia. No dia seguinte, coitadas, cabea raspada a navalha, obrigadas a capinar o Largo do Chafariz, na frente da Cadeia. 85 Becos da minha terra... Becos de assombrao. Romnticos, pecaminosos... Tm poesia e tm drama. O drama da mulher da vida, antiga, 90 humilhada, malsinada. Meretriz venrea, desprezada, mesentrica, exangue. Cabea raspada a navalha, castigada a palmatria, 95 capinando o largo, chorando. Golfando sangue. (LTIMO ATO) Um irmo vicentino comparece. Traz uma entrada grtis do So Pedro de Alcntara. 100 Uma passagem de terceira no grande coletivo de So Vicente. Uma estao permanente de repouso - no aprazvel So Miguel. Cai o pano. CORALINA, Cora. Poemas dos Becos de Gois e Estrias Mais. 21a ed. - So Paulo: Global Editora, 2006. Amo e canto com ternura / todo o errado da minha terra (texto 1, versos 29 e 30). A substantivao do adjetivo errado, antecedido pelo determinante o, que aparece no trecho acima destacado do poema de Cora Coralina
(IME -2018/2019 - 2 FASE ) Texto 1 BECOS DE GOIS 1 Beco da minha terra... Amo tua paisagem triste, ausente e suja. Teu ar sombrio. Tua velha umidade andrajosa. Teu lodo negro, esverdeado, escorregadio. 5 E a rstia de sol que ao meio-dia desce, fugidia, e semeia polmes dourados no teu lixo pobre, calando de ouro a sandlia velha, jogada no teu monturo. Amo a prantina silenciosa do teu fio de gua, 10 descendo de quintais escusos sem pressa, e se sumindo depressa na brecha de um velho cano. Amo a avenca delicada que renasce na frincha de teus muros empenados, 15 e a plantinha desvalida, de caule mole que se defende, viceja e floresce no agasalho de tua sombra mida e calada. Amo esses burros-de-lenha que passam pelos becos antigos. Burrinhos dos morros, 20 secos, lanzudos, malzelados, cansados, pisados. Arrochados na sua carga, sabidos, procurando a sombra, no range-range das cangalhas. E aquele menino, lenheiro ele, salvo seja. Sem infncia, sem idade. 25 Franzino, maltrapilho, pequeno para ser homem, forte para ser criana. Ser indefeso, indefinido, que s se v na minha cidade. Amo e canto com ternura 30 todo o errado da minha terra. Becos da minha terra, discriminados e humildes, lembrando passadas eras... Beco do Cisco. 35 Beco do Cotovelo. Beco do Antnio Gomes. Beco das Taquaras. Beco do Seminrio. Bequinho da Escola. 40 Beco do Ouro Fino. Beco da Cachoeira Grande. Beco da Calabrote. Beco do Mingu. Beco da Vila Rica... 45 Conto a estria dos becos, dos becos da minha terra, suspeitos... mal afamados onde famlia de conceito no passava. Lugar de gentinha - diziam, virando a cara. 50 De gente do pote dgua. De gente de p no cho. Becos de mulher perdida. Becos de mulheres da vida. Renegadas, confinadas 55 na sombra triste do beco. Quarto de porta e janela. Prostituta anemiada, solitria, htica, engalicada, tossindo, escarrando sangue 60 na umidade suja do beco. Becos mal assombrados. Becos de assombrao... Altas horas, mortas horas... Capito-mor - alma penada, 65 terror dos soldados, castigado nas armas. Capito-mor, alma penada, num cavalo ferrado, chispando fogo, descendo e subindo o beco, 70 comandando o quadrado - feixe de varas... Arrastando espada, tinindo esporas... Mulher-dama. Mulheres da vida, perdidas, comeavam em boas casas, depois, 75 baixavam pra o beco. Queriam alegria. Faziam bailaricos. Baile Sifiltico - era ele assim chamado. O delegado-chefe de Polcia - brabeza - dava em cima... 80 Mandava sem d, na peia. No dia seguinte, coitadas, cabea raspada a navalha, obrigadas a capinar o Largo do Chafariz, na frente da Cadeia. 85 Becos da minha terra... Becos de assombrao. Romnticos, pecaminosos... Tm poesia e tm drama. O drama da mulher da vida, antiga, 90 humilhada, malsinada. Meretriz venrea, desprezada, mesentrica, exangue. Cabea raspada a navalha, castigada a palmatria, 95 capinando o largo, chorando. Golfando sangue. (LTIMO ATO) Um irmo vicentino comparece. Traz uma entrada grtis do So Pedro de Alcntara. 100 Uma passagem de terceira no grande coletivo de So Vicente. Uma estao permanente de repouso - no aprazvel So Miguel. Cai o pano. CORALINA, Cora. Poemas dos Becos de Gois e Estrias Mais. 21a ed. - So Paulo: Global Editora, 2006. E aquele menino, lenheiro ele, salvo seja. (texto 1, verso 23) O modo em que se encontra o verbo ser na forma verbal acima destacada, em contraste com o modo de todas as outras formas verbais do poema, evoca
(IME - 2018/2019 - 2 FASE ) Texto 1 BECOS DE GOIS 1 Beco da minha terra... Amo tua paisagem triste, ausente e suja. Teu ar sombrio. Tua velha umidade andrajosa. Teu lodo negro, esverdeado, escorregadio. 5 E a rstia de sol que ao meio-dia desce, fugidia, e semeia polmes dourados no teu lixo pobre, calando de ouro a sandlia velha, jogada no teu monturo. Amo a prantina silenciosa do teu fio de gua, 10 descendo de quintais escusos sem pressa, e se sumindo depressa na brecha de um velho cano. Amo a avenca delicada que renasce na frincha de teus muros empenados, 15 e a plantinha desvalida, de caule mole que se defende, viceja e floresce no agasalho de tua sombra mida e calada. Amo esses burros-de-lenha que passam pelos becos antigos. Burrinhos dos morros, 20 secos, lanzudos, malzelados, cansados, pisados. Arrochados na sua carga, sabidos, procurando a sombra, no range-range das cangalhas. E aquele menino, lenheiro ele, salvo seja. Sem infncia, sem idade. 25 Franzino, maltrapilho, pequeno para ser homem, forte para ser criana. Ser indefeso, indefinido, que s se v na minha cidade. Amo e canto com ternura 30 todo o errado da minha terra. Becos da minha terra, discriminados e humildes, lembrando passadas eras... Beco do Cisco. 35 Beco do Cotovelo. Beco do Antnio Gomes. Beco das Taquaras. Beco do Seminrio. Bequinho da Escola. 40 Beco do Ouro Fino. Beco da Cachoeira Grande. Beco da Calabrote. Beco do Mingu. Beco da Vila Rica... 45 Conto a estria dos becos, dos becos da minha terra, suspeitos... mal afamados onde famlia de conceito no passava. Lugar de gentinha - diziam, virando a cara. 50 De gente do pote dgua. De gente de p no cho. Becos de mulher perdida. Becos de mulheres da vida. Renegadas, confinadas 55 na sombra triste do beco. Quarto de porta e janela. Prostituta anemiada, solitria, htica, engalicada, tossindo, escarrando sangue 60 na umidade suja do beco. Becos mal assombrados. Becos de assombrao... Altas horas, mortas horas... Capito-mor - alma penada, 65 terror dos soldados, castigado nas armas. Capito-mor, alma penada, num cavalo ferrado, chispando fogo, descendo e subindo o beco, 70 comandando o quadrado - feixe de varas... Arrastando espada, tinindo esporas... Mulher-dama. Mulheres da vida, perdidas, comeavam em boas casas, depois, 75 baixavam pra o beco. Queriam alegria. Faziam bailaricos. Baile Sifiltico - era ele assim chamado. O delegado-chefe de Polcia - brabeza - dava em cima... 80 Mandava sem d, na peia. No dia seguinte, coitadas, cabea raspada a navalha, obrigadas a capinar o Largo do Chafariz, na frente da Cadeia. 85 Becos da minha terra... Becos de assombrao. Romnticos, pecaminosos... Tm poesia e tm drama. O drama da mulher da vida, antiga, 90 humilhada, malsinada. Meretriz venrea, desprezada, mesentrica, exangue. Cabea raspada a navalha, castigada a palmatria, 95 capinando o largo, chorando. Golfando sangue. (LTIMO ATO) Um irmo vicentino comparece. Traz uma entrada grtis do So Pedro de Alcntara. 100 Uma passagem de terceira no grande coletivo de So Vicente. Uma estao permanente de repouso - no aprazvel So Miguel. Cai o pano. CORALINA, Cora. Poemas dos Becos de Gois e Estrias Mais. 21a ed. - So Paulo: Global Editora, 2006. O texto 1 se inicia em um processo descritivo e passa para o descritivo-narrativo. Isso se confirma pelo(a)