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(UFU - 2021)O poema abaixo, um dos mais famosos de

(UFU - 2021)

O poema abaixo, um dos mais famosos de Carlos Drummond, disseca alguns dos principais dilemas vivenciado pela humanidade que emergiu no contexto do pós-guerra.

A FLOR E A NÁUSEA

Preso à minha classe e a algumas roupas, vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjoo?
Posso, sem armas, revoltar-me?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.

Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema resolvido sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo e dou a poucos esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios, garanto que uma flor nasceu

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

ANDRADE, Carlos Drummond de. A rosa do povo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 13-14.

A) O título do poema vincula dois elementos contraditórios, a flor e a náusea, que assumem valor metafórico, cujos sentidos são desenvolvidos pelo texto poético. Qual é o campo de significado atribuído a cada um desses polos metafóricos (“flor” e “náusea”), levando-se em conta o contexto histórico de produção do poema? Fundamente sua interpretação a partir da análise do texto.

B) Em termos de forma poética, “A flor e a náusea” aparece como uma obra-prima da poesia modernista brasileira, exemplificando como os novos recursos expressivos, propostos pela estética moderna, abriram campo para a criatividade autoral. Identifique pelo menos dois exemplos de como a inovação formal modernista está presente no poema em análise, avaliando que efeito de sentido tais inovações trazem para o texto.